II Domingo da Páscoa A

A Liturgia deste Domingo, revivendo ainda a alegria do Cristo Ressuscitado, apresenta-nos a nova comunidade nascida da Cruz e Ressurreição: a Igreja. A sua missão consiste em revelar aos homens a vida nova que brota da ressurreição.
A primeira leitura descreve a comunidade cristã de Jerusalém, como uma comunidade ideal. É uma "comunidade de irmãos" preocupada em conhecer Jesus e a sua proposta de salvação, que se reúne para louvar o Senhor na oração e na Eucaristia, que vive na partilha, na doação e no serviço e que testemunha a salvação que Jesus veio propor à humanidade.
A segunda leitura lembra-nos que é pelo Baptismo que nos identificamos com Cristo. Esta identificação com Ele coloca-nos em obediência ao Pai e na entrega aos nossos irmãos. É o caminho que conduz à Ressurreição.
Primeira Leitura (Act 2,42-47)
Leitura dos Actos dos Apóstolos
Os irmãos eram assíduos ao ensino dos Apóstolos,
à comunhão fraterna, à fracção do pão e às orações.
Perante os inumeráveis prodígios e milagres
realizados pelos Apóstolos,
toda a gente se enchia de terror.
Todos os que haviam abraçado a fé
viviam unidos e tinham tudo em comum.
Vendiam propriedades e bens
e distribuíam o dinheiro por todos,
conforme as necessidades de cada um.
Todos os dias frequentavam o templo,
como se tivessem uma só alma,
e partiam o pão em suas casas;
tomavam o alimento com alegria e simplicidade de coração,
louvando a Deus e gozando da simpatia de todo o povo.
E o Senhor aumentava todos os dias
o número dos que deviam salvar-se.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 117 (118)
Refrão: Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom,
porque é eterna a sua misericórdia.
Diga a casa de Israel:
é eterna a sua misericórdia.
Diga a casa de Aarão:
é eterna a sua misericórdia.
Digam os que temem o Senhor:
é eterna a sua misericórdia.
Empurraram me para cair,
mas o Senhor me amparou.
O Senhor é a minha fortaleza e a minha glória,
foi Ele o meu Salvador.
Gritos de júbilo e de vitória nas tendas dos justos:
a mão do Senhor fez prodígios.
A pedra que os construtores rejeitaram
tornou se pedra angular.
Tudo isto veio do Senhor:
é admirável aos nossos olhos.
Este é o dia que o Senhor fez:
exultemos e cantemos de alegria.
Segunda Leitura (1Pd 1,3-9)
Leitura da Primeira Epístola de São Pedro
Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo,
que, na sua grande misericórdia, nos fez renascer,
pela ressurreição de Jesus Cristo de entre os mortos,
para uma esperança viva,
para uma herança que não se corrompe,
nem se mancha, nem desaparece,
reservada nos Céus para vós
que pelo poder de Deus sois guardados, mediante a fé,
para a salvação que se vai revelar nos últimos tempos.
Isto vos enche de alegria,
embora vos seja preciso ainda, por pouco tempo,
passar por diversas provações,
para que a prova a que é submetida a vossa fé
– muito mais preciosa que o ouro perecível,
que se prova pelo fogo –
seja digna de louvor, glória e honra,
quando Jesus Cristo Se manifestar.
Sem O terdes visto, vós O amais;
sem O ver ainda, acreditais n’Ele.
E isto é para vós fonte de uma alegria inefável e gloriosa,
porque conseguis o fim da vossa fé,
a salvação das vossas almas.
EVANGELHO – (Jo 20,19-31)
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
Na tarde daquele dia, o primeiro da semana,
estando fechadas as portas da casa
onde os discípulos se encontravam,
com medo dos judeus,
veio Jesus, colocou Se no meio deles e disse lhes:
«A paz esteja convosco».
Dito isto, mostrou lhes as mãos e o lado.
Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor.
Jesus disse lhes de novo:
«A paz esteja convosco.
Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós».
Dito isto, soprou sobre eles e disse lhes:
«Recebei o Espírito Santo:
àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados;
e àqueles a quem os retiverdes serão retidos».
Tomé, um dos Doze, chamado Dídimo,
não estava com eles quando veio Jesus.
Disseram lhe os outros discípulos:
«Vimos o Senhor».
Mas ele respondeu lhes:
«Se não vir nas suas mãos o sinal dos cravos,
se não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado,
não acreditarei».
Oito dias depois, estavam os discípulos outra vez em casa
e Tomé com eles. Veio Jesus, estando as portas fechadas,
apresentou Se no meio deles e disse:
«A paz esteja convosco».
Depois disse a Tomé:
«Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos;
aproxima a tua mão e mete a no meu lado;
e não sejas incrédulo, mas crente».
Tomé respondeu-Lhe:
«Meu Senhor e meu Deus!»
Disse lhe Jesus:
«Porque Me viste acreditaste:
felizes os que acreditam sem terem visto».
Muitos outros milagres fez Jesus na presença dos seus discípulos,
que não estão escritos neste livro.
Estes, porém, foram escritos
para acreditardes que Jesus é o Messias, o Filho de Deus,
e para que, acreditando, tenhais a vida em seu nome.
ORAÇÃO UNIVERSAL
Irmãs e irmãos:
À semelhança da primeira comunidade cristã,
que orava num só coração e numa só alma,
oremos nós também pela Igreja e pelo mundo inteiro,
dizendo (ou: cantando), numa só voz:
R. Pela ressurreição do vosso Filho, ouvi-nos, Senhor.
1. Para que os fiéis da santa Igreja
se reúnam em cada Páscoa semanal,
para escutar a Palavra, partir o pão e orar juntos, oremos.
2. Para que todos os novos baptizados
vençam a prova a que é submetida a sua fé,
mais preciosa do que o ouro perecível, oremos.
3. Para que todos os cristãos
alcancem a graça de acreditar sem terem visto
e se encontrem no seu íntimo com Jesus, oremos.
4. Para que o Senhor Jesus ressuscitado
dê a paz e a alegria aos que andam tristes,
aos pobres, aos infelizes e aos doentes, oremos.
5. Para que a nossa comunidade aqui presente,
que recebeu o perdão dos seus pecados,
adore o Pai, se entregue a Cristo e viva do Espírito, oremos.
6. Por todos os que sofrem as consequências da actual pandemia,
para que Deus nosso Senhor, conceda a cura aos enfermos,
Força aos que trabalham na saúde, conforto às famílias
e a salvação a todos as vítimas mortais, oremos.
Senhor, nosso Deus e nosso Pai,
abri o coração dos vossos filhos
ao grande dom de Jesus ressuscitado
e dai-nos a graça de O encontrar, cada domingo,
na Palavra proclamada e na fracção do Pão.
Ele que vive e reina por todos os séculos dos séculos.
Ressonâncias
O Evangelho deste Domingo apresenta-nos dois encontros da nova Comunidade com o Cristo Ressuscitado, no cenáculo. É uma catequese sobre a presença de Jesus, que continua vivo e ressuscitado, acompanhando a sua Igreja: Os Apóstolos estão reunidos, mas "trancados" e dominados pela incredulidade, pela tristeza e pelo medo. Tomé incrédulo na promessa de Cristo e na palavra dos colegas é exemplo dos que não valorizam o testemunho comunitário e dos que querem ser cristãos sem Igreja.
Hoje, ainda há muitos que vivem de "portas trancadas". Dominados pelo medo e pela insegurança, aguardam por melhores dias de justiça e de paz. O Ressuscitado derruba as trancas e restaura a paz e a alegria: "A Paz esteja convosco" (3x). Hoje, Ele torna-nos também protagonistas da Paz, que é conquistada e construída pelo empenho de todos.
No primeiro dia da semana, após a Morte e Ressurreição. Com esse primeiro dia, começa o "Dia do Senhor", o DOMINGO. O que significa para ti o Domingo? É de facto o "Dia do Senhor"?
- Jesus está no centro da Comunidade, onde todos vão beber essa vida que lhes permite vencer o medo e a hostilidade do mundo. É a videira ao redor da qual se enxertam os ramos...
- Confia a Missão: "Como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós." Continua acreditando neles e, apesar de tudo, conta com eles. Na missão, apesar de tudo, Ele conta também connosco.
- Inicia uma nova Criação: "Jesus soprou sobre eles", como Deus na criação do homem (Gn 2,7) e acrescenta: "Recebei o Espírito Santo". Com o dom do Espírito Santo, o Senhor ressuscitado inicia um mundo novo e com o envio dos discípulos inaugura-se um novo Israel, que crê em Cristo e testemunha a verdade da Ressurreição.
- Institui a Penitência: "Àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhe-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes serão retidos». Uma vez perdoados, são enviados a perdoar em nome de Deus. É um Sacramento tipicamente Pascal: nascido num clima de alegria e de vitória.
Como se chega à fé em Cristo Ressuscitado? A Comunidade é o lugar natural onde se manifesta e irradia o amor de Jesus. Longe da comunidade, Tomé não acreditou na palavra de Jesus, nem dos colegas. A sua fé reacende-se, quando no "Dia do Senhor" voltou à Comunidade e faz um belo acto de fé: "Meu Senhor e meu Deus!" E Cristo acrescenta: "Felizes os que acreditam sem terem visto."
Tomé representa aqueles que vivem afastados da comunidade, sem perceberem os sinais de vida que nela se manifestam.
Este episódio é uma alusão clara ao Domingo. Lembra as celebrações dominicais da comunidade primitiva e a nossa experiência pascal que se renova em cada Domingo. A experiência de Tomé é possível para os homens de todos os tempos.
O que significa para ti a Eucaristia Dominical?
A DIVINA MISERICÓRDIA, que hoje celebramos é garantia e força para o desempenho de nossa missão. Santo Domingo!
Oração de Santa Faustina: http://www.paroquiaqueijas.net/portal/evangelizacao/tempo-de-oracao/varios/647-oracao-de-santa-faustina
Homilia do Papa S. João Paulo II,
por ocasião da canonização da Irmã Maria Faustina Kowalska
(30 de Abril de 2000, Domingo da Misericórdia)
1. "Louvai o Senhor, porque Ele é bom, porque é eterno o Seu amor" (Sl 118, 1). Assim canta a Igreja na Oitava de Páscoa, como que recolhendo dos lábios de Cristo estas palavras do Salmo, dos lábios de Cristo ressuscitado, que no Cenáculo traz o grande anúncio da misericórdia divina e confia aos apóstolos o seu ministério: "A paz seja convosco! Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós... Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos" (Jo 20, 21-23).
Antes de pronunciar estas palavras, Jesus mostra as mãos e o lado. Isto é, indica as feridas da Paixão, sobretudo a chaga do coração, fonte onde nasce a grande onda de misericórdia que inunda a humanidade. Daquele Coração a Irmã Faustina Kowalska, a Beata a quem de agora em diante chamaremos Santa, verá partir dois fachos de luz que iluminam o mundo: "Os dois raios, explicou-lhe certa vez o próprio Jesus representam o sangue e a água" (Diário, Libreria Editrice Vaticana, pág. 132).
2. Sangue e água! O pensamento corre rumo ao testemunho do evangelista João que, quando um soldado no Calvário atingiu com a lança o lado de Cristo, vê jorrar dali "sangue e água" (cf. Jo 19, 34). E se o sangue evoca o sacrifício da cruz e o dom eucarístico, a água, na simbologia joanina, recorda não só o baptismo, mas também o dom do Espírito Santo (cf. Jo 3, 5; 4, 14; 7, 37-39).
A misericórdia divina atinge os homens através do Coração de Cristo crucificado: "Minha filha, dize que sou o Amor e a Misericórdia em pessoa", pedirá Jesus à Irmã Faustina (Diário, pág. 374). Cristo derrama esta misericórdia sobre a humanidade mediante o envio do Espírito que, na Trindade, é a Pessoa-Amor. E porventura não é a misericórdia o "segundo nome" do amor (cf. Dives in misericordia, 7), cultuado no seu aspecto mais profundo e terno, na sua atitude de cuidar de toda a necessidade, sobretudo na sua imensa capacidade de perdão?
É deveras grande a minha alegria, ao propor hoje à Igreja inteira, como dom de Deus para o nosso tempo, a vida e o testemunho da Irmã Faustina Kowalska. Pela divina Providência a vida desta humilde filha da Polónia esteve completamente ligada à história do século XX, que há pouco deixámos atrás. De facto, foi entre a primeira e a segunda guerra mundial que Cristo lhe confiou a sua mensagem de misericórdia. Aqueles que recordam, que foram testemunhas e participantes nos eventos daqueles anos e nos horríveis sofrimentos que daí derivaram para milhões de homens, bem sabem que a mensagem da misericórdia é necessária.
Jesus disse à Irmã Faustina: "A humanidade não encontrará paz, enquanto não se voltar com confiança para a misericórdia divina" (Diário, pág. 132). Através da obra da religiosa polaca, esta mensagem esteve sempre unida ao século XX, último do segundo milénio e ponte para o terceiro. Não é uma mensagem nova, mas pode-se considerar um dom de especial iluminação, que nos ajuda a reviver de maneira mais intensa o Evangelho da Páscoa, para o oferecer como um raio de luz aos homens e às mulheres do nosso tempo.
3. O que nos trarão os anos que estão diante de nós? Como será o futuro do homem sobre a terra? A nós não é dado sabê-lo. Contudo, é certo que ao lado de novos progressos não faltarão, infelizmente, experiências dolorosas. Mas a luz da misericórdia divina, que o Senhor quis como que entregar de novo ao mundo através do carisma da Irmã Faustina, iluminará o caminho dos homens do terceiro milénio.
Assim como os Apóstolos outrora, é necessário porém que também a humanidade de hoje acolha no cenáculo da história Cristo ressuscitado, que mostra as feridas da sua crucifixão e repete: A paz seja convosco! É preciso que a humanidade se deixe atingir e penetrar pelo Espírito que Cristo ressuscitado lhe dá. É o Espírito que cura as feridas do coração, abate as barreiras que nos separam de Deus e nos dividem entre nós, restitui ao mesmo tempo a alegria do amor do Pai e a da unidade fraterna.
4. É importante, então, que acolhamos inteiramente a mensagem que nos vem da palavra de Deus neste segundo Domingo de Páscoa, que de agora em diante na Igreja inteira tomará o nome de "Domingo da Divina Misericórdia". Nas diversas leituras, a liturgia parece traçar o caminho da misericórdia que, enquanto reconstrói a relação de cada um com Deus, suscita também entre os homens novas relações de solidariedade fraterna. Cristo ensinou-nos que "o homem não só recebe e experimenta a misericórdia de Deus, mas é também chamado a "ter misericórdia" para com os demais. "Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia" (Mt 5, 7)" (Dives in misericordia, 14). Depois, Ele indicou-nos as múltiplas vias da misericórdia, que não só perdoa os pecados, mas vai também ao encontro de todas as necessidades dos homens. Jesus inclinou-se sobre toda a miséria humana, material e espiritual.
A sua mensagem de misericórdia continua a alcançar-nos através do gesto das suas mãos estendidas rumo ao homem que sofre. Foi assim que O viu e testemunhou aos homens de todos os continentes a Irmã Faustina que, escondida no convento de Lagiewniki em Cracóvia, fez da sua existência um cântico à misericórdia: Misericordias Domini in aeternum cantabo.
5. A canonização da Irmã Faustina tem uma eloquência particular: mediante este acto quero hoje transmitir esta mensagem ao novo milénio. Transmito-a a todos os homens para que aprendam a conhecer sempre melhor o verdadeiro rosto de Deus e o genuíno rosto dos irmãos.
Amor a Deus e amor aos irmãos são de facto inseparáveis, como nos recordou a primeira Carta de João: "Nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus: quando amamos a Deus e guardamos os Seus mandamentos" (5, 2). O Apóstolo recorda-nos nisto a verdade do amor, indicando-nos na observância dos mandamentos a medida e o critério.
Com efeito, não é fácil amar com um amor profundo, feito de autêntico dom de si. Aprende-se este amor na escola de Deus, no calor da sua caridade. Ao fixarmos o olhar n'Ele, ao sintonizarmo-nos com o seu coração de Pai, tornamo-nos capazes de olhar os irmãos com olhos novos, em atitude de gratuidade e partilha, de generosidade e perdão. Tudo isto é misericórdia!
Na medida em que a humanidade souber aprender o segredo deste olhar misericordioso, manifesta-se como perspectiva realizável o quadro ideal, proposto na primeira leitura: "A multidão dos que haviam abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma. Ninguém chamava seu ao que lhe pertencia mas, entre eles, tudo era comum" (Act 4, 32). Aqui a misericórdia do coração tornou-se também estilo de relações, projecto de comunidade, partilha de bens. Aqui floresceram as "obras da misericórdia", espirituais e corporais. Aqui a misericórdia tornou-se um concreto fazer-se "próximo" dos irmãos mais indigentes.
6. A Irmã Faustina Kowalska deixou escrito no seu Diário: "Sinto uma tristeza profunda, quando observo os sofrimentos do próximo. Todas as dores do próximo se repercutem no meu coração; trago no meu coração as suas angústias, de tal modo que me abatem também fisicamente.
Desejaria que todos os sofrimentos caíssem sobre mim, para dar alívio ao próximo" (pág. 365). Eis a que ponto de partilha conduz o amor, quando é medido segundo o amor de Deus!
É neste amor que a humanidade de hoje se deve inspirar, para enfrentar a crise de sentido, os desafios das mais diversas necessidades, sobretudo a exigência de salvaguardar a dignidade de cada pessoa humana. A mensagem de misericórdia divina é assim, implicitamente, também uma mensagem sobre o valor de todo o homem. Toda a pessoa é preciosa aos olhos de Deus; Cristo deu a vida por cada um; o Pai dá o seu Espírito a todos, oferecendo-lhes o acesso à Sua intimidade.
7. Esta mensagem consoladora dirige-se sobretudo a quem, afligido por uma provação particularmente dura ou esmagado pelo peso dos pecados cometidos, perdeu toda a confiança na vida e se sente tentado a ceder ao desespero. Apresenta-se-lhe o rosto suave de Cristo, chegando-lhe aqueles raios que partem do seu Coração e iluminam, aquecem e indicam o caminho, e infundem esperança. Quantas almas já foram consoladas pela invocação "Jesus, confio em Ti", que a Providência sugeriu através da Irmã Faustina! Este simples acto de abandono a Jesus dissipa as nuvens mais densas e faz chegar um raio de luz à vida de cada um.
"Jezu ufam tobie!"
8. Misericordias Domini in aeternum cantabo (Sl 88 [89], 2). À voz de Maria Santíssima, "Mãe da misericórdia", à voz desta nova Santa, que na Jerusalém celeste canta a misericórdia juntamente com todos os amigos de Deus, unamos também nós, Igreja peregrinante, a nossa voz.
E tu, Faustina, dom de Deus ao nosso tempo, dádiva da terra da Polónia à Igreja inteira, obtém-nos a graça de perceber a profundidade da misericórdia divina, ajuda-nos a torná-la experiência viva e a testemunhá-la aos irmãos! A tua mensagem de luz e de esperança se difunda no mundo inteiro, leve à conversão os pecadores, amenize as rivalidades e os ódios, abra os homens e as nações à prática da fraternidade. Hoje, ao fixarmos contigo o olhar no rosto de Cristo ressuscitado, fazemos nossa a tua súplica de confiante abandono e dizemos com firme esperança:
Jesus Cristo, confio em Ti!
S. João Paulo II, 30 de Abril de 2000
«Se não meter o dedo no lugar dos cravos
e a mão no seu lado não acreditarei.» (Jo 20, 2s)
Carta ao discípulo das dúvidas
Caríssimo S. Tomé
É uma enorme ousadia dirigir-te estas breves linhas mas sinto-me tantas vezes identificado contigo que até já te chamei o “santo padroeiro das nossas dúvidas”, e gostaria de dizer-to pessoalmente. É verdade que hoje podia escrever sobre muitos assuntos: no primeiro domingo de Maio lembramos as nossas mães (ainda bem que elas se lembram de nós todos os dias do ano!); ocorre também a celebração do dia do trabalhador (nestes tempos em que o desemprego é dos maiores flagelos que nos atinge!); em Roma é beatificado João Paulo II, o Papa que tanto nos tocou nas suas inúmeras viagens e nos encontros com as multidões; e o FMI anda por aqui a tomar conta das nossas finanças em descalabro. Tanta matéria mas tu não me saíste do pensamento.
“Ver para crer como São Tomé” tornou-se um dito popular. Mas nem imaginas como a tua inquietação é tão importante para a nossa fé. Não te fechaste na incredulidade, mas pediste para experimentar o encontro com o Jesus vivo que os outros discípulos diziam ter feito. Querias compreender melhor. E isso também nós, também todos os que procuram Deus de coração sincero e acreditam sem terem visto. Saberias como é fácil passar da desilusão ao entusiasmo com uma falsa ideia, e como são perigosos o fanatismo e a irracionalidade misturados com uma “fé cheia de certezas”? O certo é que puseste os “pontos nos iis”. Um espírito, um anjo, uma aparição de qualquer coisa, vá lá, mas o Mestre, que aprenderas a amar e a conhecer, que tinhas visto morrer e isso tinha-te rasgado o coração que até desapareceras naqueles dias (é verdade, por onde andaste naqueles oito dias?), se aparecera ressuscitado tinha de ter os sinais da paixão. Senão, era um embusteiro, e tinham sido enganados; não foi o que pensaste?
Sabes, isto de confiar e de acreditar não é fácil. É colocarmo-nos nas mãos de outro, como um bebé se lança nas mãos dos pais (e são tão importantes os primeiros anos para desenvolver esta confiança fundamental que nos leva à idade adulta), como quem se ama e quer amar todos os dias. A confiança é um caminho feito de fragilidades mútuas; ferimo-nos e desanimamos mas importa reconquistá-la com os sinais da nossa paixão, com a verdade de não sermos perfeitos. O pior é sempre ficarmos fechados: no erro, na intransigência, na soberba, ou na indiferença. E a fé só se vive caminhando, recusando a sedentarização dos sonhos, a auto-suficiência do legalismo, e promovendo a feliz caminhada de todos, com Jesus, ao encontro do Pai. Obrigado por nos ensinares a abrir a inteligência e o coração, a duvidar com desejo de acreditar, a ver e a tocar para lá do visível e do tangível!
Viste o homem Jesus com os sinais da morte e acreditaste no homem Filho de Deus ressuscitado. Jesus era o mesmo e também substancialmente Outro. Porque a vida eterna de Deus é esta vida que se torna outra. E só com humildade e alegria podemos dizer como tu: “Meu Senhor e meu Deus!”
Lembro-te em cada uma das minhas dúvidas, querido São Tomé!
P. Vítor Gonçalves
Domingo de Ramos - A
Celebramos o último domingo da Quaresma: O Domingo de Ramos na Paixão do Senhor.
A liturgia deste último Domingo da Quaresma apresenta-nos dois momentos bem distintos: a entrada triunfante de Jesus em Jerusalém, em ambiente de alegria; e o início da Semana Santa, com a leitura da Paixão do Senhor, relembrando o caminho do sofrimento, da humilhação e da Cruz do Senhor Jesus.
A primeira leitura apresenta-nos um profeta anónimo, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com fidelidade, o projecto do Pai. Os primeiros cristãos viram neste “servo” a figura de Jesus.
A segunda leitura mostra-nos o exemplo de Cristo que escolheu a obediência ao Pai e o serviço aos homens, entregando-se completamente. É esse mesmo caminho de vida que a Palavra de Deus nos propõe.
O Evangelho convida-nos a contemplar a paixão e morte de Jesus: é o momento supremo de uma vida feita dom e serviço, a fim de libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo e escravidão. Na cruz, revela-se o amor de Deus – esse amor que não guarda nada para si, mas que se faz dom total.
Quando quiseram aclamar Jesus como rei, Ele fugiu pelo meio da multidão. Agora, perante os soldados romanos, é coroado de espinhos na ignomínia e no meio de insultos. Perante tal espectáculo, como podemos nós querer honras, prestígios, louros?
O nosso Rei está coroado de espinhos. Não deixemos de olhar para o sofrimento que invade a vida da humanidade neste tempo tão doloroso de pandemia, angústia e medo, incerteza e insegurança, perda e cansaço, solidão e falta de pão... Pensar no sofrimento de Jesus deve fazer-nos socorrer, acompanhar, amar os cristos que hoje sofrem no nosso mundo.
Primeira Leitura (Is 50,4-7)
Leitura do Livro de Isaías
O Senhor deu-me a graça de falar como um discípulo,
para que eu saiba dizer uma palavra de alento
aos que andam abatidos.
Todas as manhãs Ele desperta os meus ouvidos,
para eu escutar, como escutam os discípulos.
O Senhor Deus abriu-me os ouvidos
e eu não resisti nem recuei um passo.
Apresentei as costas àqueles que me batiam,
e a face aos que me arrancavam a barba;
não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam.
Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio,
e, por isso, não fiquei envergonhado;
tornei o meu rosto duro como pedra,
e sei que não ficarei desiludido.
Salmo Responsorial – Salmo 21 (22)
Refrão: Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?
Todos os que me vêem escarnecem de mim,
estendem os lábios e meneiam a cabeça:
«Confiou no Senhor, Ele que o livre,
Ele que o salve, se é seu amigo».
Matilhas de cães me rodearam,
cercou-me um bando de malfeitores.
Trespassaram as minhas mãos e os meus pés,
posso contar todos os meus ossos.
Repartiram entre si as minhas vestes
e deitaram sortes sobre a minha túnica.
Mas Vós, Senhor, não Vos afasteis de mim,
sois a minha força, apressai-Vos a socorrer-me.
Hei-de falar do vosso nome aos meus irmãos,
hei-de louvar-Vos no meio da assembleia.
Vós, que temeis o Senhor, louvai-O,
glorificai-O, vós todos os filhos de Jacob,
reverenciai-O, vós todos os filhos de Israel.
Segunda Leitua (Fil 2,6-11)
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Filipenses
Cristo Jesus, que era de condição divina,
não Se valeu da sua igualdade com Deus,
mas aniquilou-Se a Si próprio.
Assumindo a condição de servo,
tornou-Se semelhante aos homens.
Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais,
obedecendo até à morte e morte de cruz.
Por isso Deus O exaltou
e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes,
para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem
no céu, na terra e nos abismos,
e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor,
para glória de Deus Pai.
EVANGELHO (Mt 26,14 - 27,66)
N Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
N Naquele tempo,
um dos doze, chamado Judas Iscariotes,
foi ter com os príncipes dos sacerdotes e disse-lhes:
R «Que estais dispostos a dar-me para vos entregar Jesus?»
N Eles garantiram-lhe trinta moedas de prata.
E a partir de então,
Judas procurava uma oportunidade para O entregar.
No primeiro dia dos Ázimos,
os discípulos foram ter com Jesus e perguntaram-Lhe:
R «Onde queres que façamos os preparativos
para comer a Páscoa?»
N Ele respondeu:
J «Ide à cidade, a casa de tal pessoa, e dizei-lhe:
‘O Mestre manda dizer: O meu tempo está próximo.
É em tua casa que eu quero celebrar a Páscoa
com os meus discípulos’».
N Os discípulos fizeram como Jesus lhes tinha mandado,
e prepararam a Páscoa.
N Ao cair da noite, sentou-Se à mesa com os Doze.
Enquanto comiam, declarou:
J «Em verdade vos digo:
Um de vós há-de entregar-Me».
N Profundamente entristecidos, começou cada um a perguntar-Lhe:
R «Serei eu, Senhor?»
N Jesus respondeu:
J «Aquele que meteu comigo a mão no prato é que há-de entregar-Me.
O Filho do homem vai partir, como está escrito acerca d’Ele.
Mas ai daquele por quem o Filho do homem vai ser entregue!
Melhor seria para esse homem não ter nascido».
N Judas, que O ia entregar, tomou a palavra e perguntou:
R «Serei eu, Mestre?»
N Respondeu Jesus:
J «Tu o disseste».
N Enquanto comiam,
Jesus tomou o pão, recitou a bênção,
partiu-o e deu-o aos discípulos, dizendo:
J «Tomai e comei: Isto é o meu Corpo».
N Tomou em seguida um cálice, deu graças e entregou-lho, dizendo:
J «Bebei dele todos, porque este é o meu Sangue,
o Sangue da aliança, derramado pela multidão,
para remissão dos pecados.
Eu vos digo que não beberei mais deste fruto da videira,
até ao dia em que beberei convosco o vinho novo no reino de meu Pai».
N Cantaram os salmos
e seguiram para o Monte das Oliveiras.
N Então, Jesus disse-lhes:
J «Todos vós, esta noite, vos escandalizareis por minha causa,
como está escrito:
‘Ferirei o pastor e dispersar-se-ão as ovelhas do rebanho’.
Mas, depois de ressuscitar,
preceder-vos-ei a caminho da Galileia».
N Pedro interveio, dizendo:
R «Ainda que todos se escandalizem por tua causa,
eu não me escandalizarei».
N Jesus respondeu-lhe:
J «Em verdade te digo:
Esta mesma noite, antes do galo cantar, Me negarás três vezes».
N Pedro disse-lhe:
R «Ainda que tenha de morrer contigo, não Te negarei».
N E o mesmo disseram todos os discípulos.
N Então, Jesus chegou com eles a uma propriedade,
chamada Getsémani e disse aos discípulos:
J «Ficai aqui, enquanto Eu vou além orar».
N E, tomando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu,
começou a entristecer-Se e a angustiar-Se.
Disse-lhes então:
J «A minha alma está numa tristeza de morte.
Ficai aqui e vigiai comigo».
N E adiantando-Se um pouco mais, caiu com o rosto por terra,
enquanto orava e dizia:
J «Meu Pai, se é possível, passe de Mim este cálice.
Todavia, não se faça como Eu quero,
mas como Tu queres».
N Depois, foi ter com os discípulos,
encontrou-os a dormir e disse a Pedro:
J «Nem sequer pudestes vigiar uma hora comigo!
Vigiai e orai, para não cairdes em tentação.
O espírito está pronto, mas a carne é fraca».
N De novo Se afastou, pela Segunda vez, e orou, dizendo:
J «Meu Pai,
se este cálice não pode passar sem que Eu o beba,
faça-se a tua vontade».
N Voltou novamente e encontrou-os a dormir,
pois os seus olhos estavam pesados de sono.
Deixou-os e foi de novo orar, pela terceira vez,
repetindo as mesmas palavras.
Veio então ao encontro dos discípulos e disse-lhes:
J «Dormi agora e descansai.
Chegou a hora em que o Filho do homem
vai ser entregue às mãos dos pecadores.
Levantai-vos, vamos.
Aproxima-se aquele que Me vai entregar».
N Ainda Jesus estava a falar,
quando chegou Judas, um dos Doze,
e com ele uma grande multidão, com espadas e varapaus,
enviada pelos príncipes dos sacerdotes
e pelos anciãos do povo.
O traidor tinha-lhes dado este sinal:
R «Aquele que eu beijar, é esse mesmo. Prendei-O».
N Aproximou-se imediatamente de Jesus e disse-Lhe:
R «Salve, Mestre!».
N E beijou-O.
Jesus respondeu-lhe:
J «Amigo, a que vieste?».
N Então avançaram, deitaram as mãos a Jesus
e prenderam-n’O.
Um dos que estavam com Jesus levou a mão à espada,
desembainhou-a e feriu um servo do sumo sacerdote,
cortando-lhe uma orelha.
Jesus disse-lhe:
J «Mete a tua espada na bainha,
pois todos os que puxarem da espada morrerão à espada.
Pensas que não posso rogar a meu Pai
que ponha já ao meu dispor mais de doze legiões de Anjos?
Mas como se cumpririam as Escrituras,
segundo as quais assim tem de acontecer?».
N Voltando-Se depois para a multidão, Jesus disse:
J «Viestes com espadas e varapaus para Me prender
como se fosse um salteador!
Eu estava todos os dias sentado no templo a ensinar
e não Me prendestes...
Mas, tudo isto aconteceu
para se cumprirem as Escrituras das profetas».
N Então todos os discípulos O abandonaram e fugiram.
N Os que tinham prendido Jesus
levaram-n’O à presença do sumo sacerdote Caifás,
onde os escribas e os anciãos se tinham reunido.
Pedro foi-O seguindo de longe, até ao palácio do sumo sacerdote.
Aproximando-se, entrou e sentou-se com os guardas,
para ver como acabaria tudo aquilo.
Entretanto, os príncipes dos sacerdotes e todo o Sinédrio
procuravam um testemunho falso contra Jesus
para O condenarem à morte, mas não o encontravam,
embora se tivessem apresentado muitas testemunhas falsas.
Por fim, apresentaram-se duas que disseram:
R «Este homem afirmou:
‘Posso destruir o templo de Deus e reconstruí-lo em três dias’».
N Então, o sumo sacerdote levantou-se e disse a Jesus:
R «Não respondes nada?
Que dizes ao que depõem contra Ti?»
N Mas Jesus continuava calado.
Disse-Lhe o sumo sacerdote:
«Eu Te conjuro pelo Deus vivo,
que nos declares se és Tu o Messias, o Filho de Deus».
N Jesus respondeu-lhe:
J «Tu o disseste.
E Eu digo-vos: vereis o Filho do homem sentado
à direita do Todo-poderoso, vindo sobre as nuvens do céu».
N Então, o sumo sacerdote rasgou as vestes, dizendo:
R «Blasfemou.
Que necessidade temos de mais testemunhas?
Acabais de ouvir a blasfémia. Que vos parece?»
N Eles responderam:
R «É réu de morte».
N Cuspiram-Lhe então no rosto e deram-Lhe punhadas.
Outros esbofeteavam-n’O, dizendo:
R «Adivinha, Messias: quem foi que Te bateu?»
N Entretanto, Pedro estava sentado no pátio.
Uma criada aproximou-se dele e disse-lhe:
R «Tu também estavas com Jesus, o galileu».
N Mas ele negou diante de todos, dizendo:
R «Não sei o que dizes».
N Dirigindo-se para a porta,
foi visto por outra criada que disse aos circunstantes:
R «Este homem estava com Jesus de Nazaré».
N E, de novo, ele negou com juramento:
R «Não conheço tal homem».
N Pouco depois, aproximaram-se os que ali estavam
e disseram a Pedro:
R «Com certeza tu és deles, pois até a fala te denuncia».
N Começou então a dizer imprecações e a jurar:
R «Não conheço tal homem».
N E, imediatamente, um galo cantou.
Então, Pedro lembrou-se das palavras que Jesus dissera:
«Antes do galo cantar, tu Me negarás três vezes».
E, saindo, chorou amargamente.
Ao romper da manhã,
todos os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo
se reuniram em conselho contra Jesus,
para Lhe darem a morte.
Depois de Lhe atarem as mãos,
levaram-n’O e entregaram-n’O ao governador Pilatos.
Então Judas, que entregara Jesus,
vendo que Ele tinha sido condenado,
tocado pelo remorso, devolveu as trinta moedas de prata
aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos, dizendo:
R «Pequei, entregando sangue inocente».
N Mas eles replicaram:
R «Que nos importa? É lá contigo».
N Então, arremessou as moedas para o santuário,
saiu dali e foi-se enforcar.
Mas os príncipes dos sacerdotes apanharam as moedas e disseram:
R «Não se podem lançar no tesouro, porque são preço de sangue».
N E, depois de terem deliberado,
compraram com elas o Campo do Oleiro.
Por este motivo se tem chamado àquele campo,
até ao dia de hoje, «Campo de Sangue».
Cumpriu-se então o que fora dito pelo profeta:
«Tomaram trinta moedas de prata, preço em que foi avaliado
Aquele que os filhos de Israel avaliaram
e deram-nas pelo Campo do Oleiro,
como o Senhor me tinha ordenado».
N Entretanto, Jesus foi levado à presença do governador,
que lhe perguntou:
R «Tu és o Rei dos judeus?»
N Jesus respondeu:
J «É como dizes».
N Mas, ao ser acusado pelos príncipes dos sacerdotes
e pelos anciãos, nada respondeu.
Disse-Lhe então Pilatos:
R «Não ouves quantas acusações levantam contra Ti?»
N Mas Jesus não respondeu coisa alguma,
a ponto de o governador ficar muito admirado.
Ora, pela festa da Páscoa,
o governador costumava soltar um preso, à escolha do povo.
Nessa altura, havia um preso famoso, chamado Barrabás.
E, quando eles se reuniram, disse-lhes:
R «Qual quereis que vos solte?»
Barrabás, ou Jesus, chamado Cristo?»
N Ele bem sabia que O tinham entregado por inveja.
Enquanto estava sentado no tribunal,
a mulher mandou-lhe dizer:
R «Não te prendas com a causa desse justo,
pois hoje sofri muito em sonhos por causa d’Ele».
N Entretanto, os príncipes dos sacerdotes e os anciãos
persuadiram a multidão a que pedisse Barrabás
e fizesse morrer Jesus.
O governador tomou a palavra e perguntou-lhes:
R «Qual dos dois quereis que vos solte?»
N Eles responderam:
R «Barrabás».
N Disse-lhes Pilatos:
R «E que hei-de fazer de Jesus, chamado Cristo?»
N Responderam todos:
R «Seja crucificado».
N Pilatos insistiu:
R «Que mal fez Ele?»
N Mas eles gritavam cada vez mais:
R «Seja crucificado».
N Pilatos insistiu:
R «Que mal fez Ele?»
N Mas eles gritavam cada vez mais:
R «Seja crucificado».
N Pilatos, vendo que não conseguia nada
e aumentava o tumulto, mandou vir água
e lavou as mãos na presença da multidão, dizendo:
R «Estou inocente do sangue deste homem.
Isso é lá convosco».
N E todo o povo respondeu:
R «O seu sangue caia sobre nós e sobre os nossos filhos».
N Soltou-lhes então Barrabás.
E, depois de ter mandado açoitar Jesus,
entregou-lh’O para ser crucificado.
Então os soldados do governador
levaram Jesus para o pretório
e reuniram à volta d’Ele toda a coorte.
Tiraram-Lhe a roupa e envolveram-n’O num manto vermelho.
Teceram uma coroa de espinhos e puseram-Lha na cabeça
e colocaram uma cana na sua mão direita.
Ajoelhando diante d’Ele, escarneciam-n’O, dizendo:
R «Salve, rei dos judeus!»
N Depois, cuspiam-Lhe no rosto
e, pegando na cana, batiam-Lhe com ela na cabeça.
Depois de O terem escarnecido,
tiraram-Lhe o manto, vestiram-Lhe as suas roupas
e levaram-n’O para ser crucificado.
N Ao saírem,
encontraram um homem de Cirene, chamado Simão,
e requisitaram-no para levar a cruz de Jesus.
Chegados a um lugar chamado Gólgota,
que quer dizer lugar do Calvário,
deram-Lhe a beber vinho misturado com fel.
Mas Jesus, depois de o provar, não quis beber.
Depois de O terem crucificado,
repartiram entre si as suas vestes, tirando-as à sorte,
e ficaram ali sentados a guardá-l’O.
Por cima da sua cabeça puseram um letreiro,
indicando a causa da sua condenação:
«Este é Jesus, o rei dos judeus».
Foram crucificados com Ele dois salteadores,
um à direita e outro à esquerda.
Os que passavam insultavam-n’O
e abanavam a cabeça, dizendo:
R «Tu, que destruías o templo e o reedificavas em três dias,
salva-Te a Ti mesmo;
Se és Filho de Deus, desce da cruz».
N Os príncipes dos sacerdotes,
juntamente com os escribas e os anciãos,
também troçavam d’Ele, dizendo:
R «Salvou os outros e não pode salvar-Se a Si mesmo!
Se é o Rei de Israel,
desça agora da cruz e acreditaremos n’Ele.
Confiou em Deus: Ele que O livre agora, se O ama,
porque disse: ‘Eu sou Filho de Deus’».
N Até os salteadores crucificados com Ele o insultavam.
Desde o meio-dia até às três horas da tarde,
as trevas envolveram toda a terra.
E, pelas três horas da tarde, Jesus clamou com voz forte:
J «Eli, Eli, lema sabachtani!»,
N que quer dizer:
«Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonastes?»
Alguns dos presentes, ouvindo isto, disseram:
R «Está a chamar por Elias».
N Um deles correu a tomar uma esponja,
embebeu-a em vinagre,
pô-la na ponta duma cana e deu-Lhe a beber.
Mas os outros disseram:
R «Deixa lá. Vejamos se Elias vem salvá-l’O».
N E Jesus, clamando outra vez com voz forte, expirou.
N Então, o véu do templo rasgou-se em duas partes,
de alto a baixo;
a terra tremeu e as rochas fenderam-se.
Abriram-se os túmulos
e muitos dos corpos de santos que tinham morrido ressuscitaram;
e, saindo do sepulcro, depois da ressurreição de Jesus,
entraram na cidade santa e apareceram a muitos.
Entretanto, o centurião e os que com ele guardavam Jesus,
ao verem o tremor de terra e o que estava a acontecer,
ficaram aterrados e disseram:
R «Este era verdadeiramente Filho de Deus».
N Estavam ali, a observar de longe, muitas mulheres
que tinham seguido Jesus desde a Galileia, para O servirem.
Entre elas encontrava-se Maria Madalena,
Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu.
Ao cair da tarde, veio um homem rico de Arimateia, chamado José,
que também se tinha tornado discípulo de Jesus.
Foi ter com Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus.
E Pilatos ordenou que lho entregassem.
José tomou o corpo, envolveu-o num lençol limpo
e depositou-o no seu sepulcro novo
que tinha mandado escavar na rocha.
Depois rolou uma grande pedra para a entrada do sepulcro, e retirou-se.
Entretanto, estavam ali Maria Madalena e a outra Maria,
sentadas em frente do sepulcro.
No dia seguinte, isto é, depois da Preparação,
os príncipes dos sacerdotes e os fariseus
foram ter com Pilatos e disseram-lhe:
R «Senhor, lembrámo-nos do que aquele impostor disse
quando ainda era vivo: ‘Depois de três dias ressuscitarei’.
Por isso, manda que o sepulcro seja mantido em segurança até ao terceiro dia,
para que não venham os discípulos roubá-lo
e dizer ao povo: ‘Ressuscitou dos mortos’.
E a última impostura seria pior do que a primeira».
N Pilatos respondeu:
R «Tendes à vossa disposição a guarda: ide e guardai-o como entenderdes».
N Eles foram e guardaram o sepulcro, selando a pedra e pondo a guarda.
Ressonâncias
O que é para nós hoje celebrar a Paixão e Morte de Jesus?
Não será contemplar a mais espantosa história de amor de Deus para connosco?
Por amor, Ele veio ao nosso encontro, assumiu os nossos limites e as nossas fragilidades, experimentou o sono e a fome, o cansaço e a tentação, tremeu perante a morte, suou sangue antes de aceitar a vontade do Pai; e, estendido no chão, atraiçoado, abandonado, incompreendido, continuou a amar-nos.
Contemplar a Cruz significa assumir a mesma atitude e solidarizar-se com aqueles que são ainda hoje crucificados neste mundo: os que sofrem violência, os explorados, os excluídos, os que são privados dos seus direitos e de dignidade…
Significa denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo; significa evitar que os homens continuem a crucificar outros homens; significa aprender com Jesus a entregar a vida por amor…
Viver desta maneira pode conduzir à morte, mas o cristão sabe que o amor gera vida nova e introduz na nossa carne os dinamismos da Ressurreição...
Estamos nós dispostos - nesta Semana Santa - a abrir o coração para acolher o mistério do infinito amor de Deus, que se oferece por cada um de nós? Ele solicita um espaço na nossa vida. Não tenhamos medo de abrir-Lhe o nosso coração!
Oração Universal
Irmãs e irmãos:
Contemplando a Cristo, nosso Salvador,
oremos pela salvação de todos os homens,
vítimas do ódio, da violência e da injustiça,
dizendo (ou: cantando), confiadamente:
R. Abençoai, Senhor, o vosso povo.
1. Pela santa Igreja, seus ministros e fiéis,
para que, vivendo na fé o mistério da Paixão,
recolham da árvore da cruz o fruto da esperança,
Oremos ao Senhor
2. Pelos que fazem as leis e julgam os homens,
para que defendam os inocentes e os oprimidos
e restabeleçam o direito e a verdade,
Oremos ao Senhor
3. Pelos ateus e pelos cristãos sem fé,
para que, à semelhança do centurião do Evangelho,
descubram em Cristo crucificado o Filho de Deus,
Oremos ao Senhor
4. Pelos doentes, os moribundos e os agonizantes,
para que sintam junto de si o Salvador,
que nas mãos do Pai entregou o seu espírito,
Oremos ao Senhor
5. Por todos nós e pela nossa comunidade (paroquial),
para que, unidos à paixão e morte do Redentor,
sejamos conduzidos à glória da Ressurreição,
Oremos ao Senhor
6. Por todos os que sofrem as consequências da actual pandemia,
para que Deus nosso Senhor, conceda a cura aos enfermos,
Força aos que trabalham na saúde, conforto às famílias
e a salvação a todos as vítimas mortais.
Oremos ao Senhor
Senhor, nosso Deus,
que Vos dignastes contar-nos entre o número daqueles
para quem o vosso Filho implorou o perdão ao expirar,
dai-nos a graça de descobrir, à luz da fé,
o amor infinito com que nos amais.
Por Cristo, nosso Senhor.
Como Tu queres!
“Meu Pai, se é possível passe de Mim este cálice.
Todavia, não se faça como Eu quero,
mas como Tu queres.” (Mt 26, 39)
É nos quadros de Rembrandt e Turner e dos paisagistas holandeses que melhor vejo os tons destes dias da Semana Santa. Os vários matizes do escuro, das tempestades e das trevas que carregam de densidade as pinturas albergam também uma luz que brilha em algum lugar. Uma luz, por mais pequena que seja, a impedir o aparente triunfo das trevas. Assim são os relatos da paixão de Jesus, e mesmo a luminosa e festiva entrada em Jerusalém não afasta do coração dos discípulos as nuvens negras do sofrimento predito pelo Mestre. É o claro-escuro dessa noite maior da agonia de Jesus que é, tantas vezes, também a nossa!
Imaginar que o Pai queria a morte sofredora do Filho só é possível alimentando uma imagem muito distorcida de Deus. É o amor até ao fim, o amor totalmente entregue como só Deus pode fazer, na fidelidade a si mesmo, que vemos na paixão de Jesus. A fidelidade que se faz luminosa nas palavras do “Diário” de Etty Hillesum, a jovem judia morta no campo de concentração de Auschwitz a 30 de Novembro de 1943: “Ser fiel a tudo o que uma pessoa iniciou num momento espontâneo, demasiado espontâneo, por vezes. / Ser fiel a cada sentimento, cada pensamento que começou a germinar. / Fiel no sentido mais lato da palavra. / Fiel a si mesmo, a Deus, fiel aos seus próprios melhores momentos. / E onde uma pessoa está, ser totalmente, cem por cento ser. / O meu “fazer” consistirá em “ser”. Assim, o grito humano do “passe de Mim este cálice” está unido em Jesus ao “como Tu queres”. As duas palavras num único sim, o escuro com o ponto de luz que impulsiona para a vida oferecida de Jesus: “Ninguém Me tira a vida; Eu dou-a livremente” (Jo 10, 18).
Há muito de paixão nesta crise que atravessamos. Uma crise que, mais do que económica, é também de confiança: em instituições e em pessoas concretas, nas políticas seguidas e nos valores que as fundamentaram, nas palavras e na justiça. Desejam-se medidas salvadoras, pedem-se sacrifícios, mas estarão elas ao serviço de uma transformação mais profunda da sociedade? A verdadeira mudança é “por dentro” que se faz; é no “ser” e não no “parecer”; é com todos e não prolonga privilégios; passa pela morte para poder ressuscitar. E quando a confiança é ferida são precisos gestos corajosos para a restaurar!
Acredito que Deus tem um “querer” para mim e para todos. Que não significa nenhum “plano especial de crescimento” mas o “plano de salvação” já realizado na Páscoa de Cristo. Realizado e a ser feito real pelo encontro do meu “querer” com o d’Ele. Que é “amar até ao fim”. Em tudo o que é profundamente humano. No coração da crise e do seu “escuro-claro”. Na política, na economia e na justiça. No trabalho e nos centros de decisão. Mas eu e vocês, que acreditamos e dizemos viver com Jesus, queremos mesmo o que o Pai quer? Quando isso implica paixão e morte?
Vítor Gonçalves
Com ramos de oliveira aclamamos-Te, Senhor!
Aclamamos-Te, querendo unir-nos a todos aqueles que sofrem.
A tantos doentes dominados pela dor,
a tantas famílias dilaceradas pela droga,
a todos os casais desfeitos pela solidão e a falta de afecto,
a tantas crianças cheias de coisas e tão carenciadas de amor.
Aclamamos-Te, pedindo-Te que nos ajudes a acompanhar a vida
de tantos emigrantes subjugados pela saudade e insegurança,
de todos os que estão tristes, desanimados e sem vontade de viver,
daqueles que não têm valores que valham a pena,
daqueles que têm mágoas que ninguém consola,
daqueles que cumprem penas em cadeias desumanizadas...
Aclamamos-Te, contentes porque nos enches de esperança.
Por isso acreditamos que este mundo tem remédio,
que, como Tu, se pode dar a vida para criar vida.
que juntos contigo e com os outros somos uma família,
que pouco a pouco vamos construindo o Teu Reino
e que nos juntaremos no Teu abraço final no fim dos tempos.
Aclamamos-Te, felicitamos-Te e admiramos-Te,
por tão bem nos teres explicado a melhor maneira de viver,
pela forma como nos revelaste que o nosso Deus é Pai,
porque nos abriste caminhos novos e nos encheste de sonhos,
porque, apesar das coisas terem sido difíceis, foste até ao fim,
porque nos convidas a viver à Tua maneira e a contar com a Tua presença.
E porque sentimos que caminhas ao nosso lado pela estrada da vida...
Obrigado, Jesus, a tua Paixão valeu a pena!
V Domingo da Quaresma A
A Liturgia da Palavra deste quinto Domingo da Quaresma garante que o desígnio de Deus é a comunicação de uma vida que ultrapassa definitivamente a vida terrena: é a vida definitiva que supera a morte.
Na primeira leitura, Deus oferece ao seu Povo uma Vida Nova. O Povo, exilado na Babilónia, desesperado e sem futuro, vivia uma situação de Morte. O profeta Ezequiel procura alimentar a esperança dos exilados e transmite-lhes a certeza de que o Deus libertador e salvador não os abandona.
O texto apresenta a famosa visão dos ossos ressequidos. O Espírito do Senhor sopra sobre eles e eles ganham vida. Deus vai transformar a morte em vida, o desespero em esperança, a escravidão em libertação. Também nós passamos por situações de morte. Quais são as situações de morte na nossa vida, que precisam do sopro do Espírito de Deus, para que se transformem em vida, alegria, certeza, esperança?
A segunda leitura lembra-nos que, no dia do nosso Baptismo, optámos por Cristo e pela vida nova que Ele veio oferecer. Convida-nos, assim, a sermos coerentes com essa escolha, a fazermos as obras de Deus e a vivermos “segundo o Espírito”.
O Evangelho apresenta-nos Jesus como o “Senhor da Vida”. Garante-nos que Ele veio realizar o desígnio de Deus e dar aos homens a vida definitiva. Ser “amigo” de Jesus e aderir à sua proposta, é entrar na vida definitiva. Os crentes que vivem deste jeito experimentam a morte física; mas não estão mortos: vivem para sempre em Deus.
Primeira Leitura (Ez 37,12-14)
Leitura da Profecia de Ezequiel
Assim fala o Senhor Deus:
«Vou abrir os vossos túmulos
e deles vos farei ressuscitar, ó meu povo,
para vos reconduzir à terra de Israel.
Haveis de reconhecer que Eu sou o Senhor,
quando abrir os vossos túmulos
e deles vos fizer ressuscitar, ó meu povo.
Infundirei em vós o meu espírito e revivereis.
Hei-de fixar-vos na vossa terra
e reconhecereis que Eu, o Senhor, o disse e o executarei».
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 129 (130)
Refrão: No Senhor está a misericórdia e abundante redenção.
Do profundo abismo chamo por Vós, Senhor,
Senhor, escutai a minha voz.
Estejam os vossos ouvidos atentos
à voz da minha súplica.
Se tiverdes em conta as nossas faltas,
Senhor, quem poderá salvar-se?
Mas em Vós está o perdão,
para Vos servirmos com reverência.
Eu confio no Senhor,
a minha alma espera na sua palavra.
A minha alma espera pelo Senhor
mais do que as sentinelas pela aurora.
Porque no Senhor está a misericórdia
e com Ele abundante redenção.
Ele há-de libertar Israel
de todas as suas faltas.
Segunda Leitura (Rom 8,8-11)
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
Irmãos:
Os que vivem segundo a carne não podem agradar a Deus.
Vós não estais sob o domínio da carne, mas do Espírito,
se é que o Espírito de Deus habita em vós.
Mas, se alguém não tem o Espírito de Cristo,
não Lhe pertence.
Se Cristo está em vós,
embora o vosso corpo seja mortal por causa do pecado,
o espírito permanece vivo por causa da justiça.
E, se o Espírito d’Aquele que ressuscitou Jesus de entre os mortos
habita em vós,
Ele, que ressuscitou Cristo Jesus de entre os mortos,
também dará vida aos vossos corpos mortais,
pelo seu Espírito que habita em vós.
EVANGELHO (Jo 11,1-45)
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
Naquele tempo,
estava doente certo homem, Lázaro de Betânia,
aldeia de Marta e de Maria, sua irmã.
Maria era aquela que tinha ungido o Senhor com perfume
e Lhe tinha enxugado os pés com os cabelos.
Era seu irmão Lázaro que estava doente.
As irmãs mandaram então dizer a Jesus:
«Senhor, o teu amigo está doente».
Ouvindo isto, Jesus disse:
«Essa doença não é mortal, mas é para a glória de Deus,
para que por ela seja glorificado o Filho do homem».
Jesus era amigo de Marta, de sua irmã e de Lázaro.
Entretanto, depois de ouvir dizer que ele estava doente,
ficou ainda dois dias no local onde Se encontrava.
Depois disse aos discípulos:
«Vamos de novo para a Judeia».
Os discípulos disseram-Lhe:
«Mestre, ainda há pouco os judeus procuravam apedrejar-Te e voltas para lá?»
Jesus respondeu:
«Não são doze as horas do dia?
Se alguém andar de dia, não tropeça, porque vê a luz deste mundo.
Mas se andar de noite, tropeça, porque não tem luz consigo».
Dito isto, acrescentou:
«O nosso amigo Lázaro dorme, mas Eu vou despertá-lo».
Disseram então os discípulos:
«Senhor, se dorme, está salvo».
Jesus referia-se à morte de Lázaro, mas eles entenderam que falava do sono natural.
Disse-lhes então Jesus abertamente:
«Lázaro morreu; por vossa causa, alegro-Me de não ter estado lá, para que acrediteis.
Mas, vamos ter com ele».
Tomé, chamado Dídimo, disse aos companheiros:
«Vamos nós também, para morrermos com Ele».
Ao chegar, Jesus encontrou o amigo sepultado havia quatro dias.
Betânia distava de Jerusalém cerca de três quilómetros.
Muitos judeus tinham ido visitar Marta e Maria,
para lhes apresentar condolências pela morte do irmão.
Quando ouviu dizer que Jesus estava a chegar, Marta saiu ao seu encontro,
enquanto Maria ficou sentada em casa.
Marta disse a Jesus:
«Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido.
Mas sei que, mesmo agora, tudo o que pedires a Deus, Deus To concederá».
Disse-lhe Jesus: «Teu irmão ressuscitará».
Marta respondeu:
«Eu sei que há-de ressuscitar na ressurreição, no último dia».
Disse-lhe Jesus:
«Eu sou a ressurreição e a vida. Quem acredita em Mim,
ainda que tenha morrido, viverá;
E todo aquele que vive e acredita em Mim, nunca morrerá. Acreditas nisto?»
Disse-Lhe Marta:
«Acredito, Senhor, que Tu és o Messias, o Filho de Deus, que havia de vir ao mundo».
Dito isto, retirou-se e foi chamar Maria, a quem disse em segredo:
«O Mestre está ali e manda-te chamar».
Logo que ouviu isto, Maria levantou-se e foi ter com Jesus.
Jesus ainda não tinha chegado à aldeia,
mas estava no lugar em que Marta viera ao seu encontro.
Então os judeus que estavam com Maria em casa para lhe apresentar condolências,
ao verem-na levantar-se e sair rapidamente,
seguiram-na, pensando que se dirigia ao túmulo para chorar.
Quando chegou aonde estava Jesus,
Maria, logo que O viu, caiu-Lhe aos pés e disse-Lhe:
«Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido».
Jesus, ao vê-la chorar, e vendo chorar também os judeus que vinham com ela,
comoveu-Se profundamente e perturbou-Se.
Depois perguntou: «Onde o pusestes?»
Responderam-Lhe: «Vem ver, Senhor».
E Jesus chorou.
Diziam então os judeus: «Vede como era seu amigo».
Mas alguns deles observaram:
«Então Ele, que abriu os olhos ao cego,
não podia também ter feito que este homem não morresse?»
Entretanto, Jesus, intimamente comovido, chegou ao túmulo.
Era uma gruta, com uma pedra posta à entrada.
Disse Jesus: «Tirai a pedra».
Respondeu Marta, irmã do morto:
«Já cheira mal, Senhor, pois morreu há quatro dias».
Disse Jesus:
«Eu não te disse que, se acreditasses, verias a glória de Deus?»
Tiraram então a pedra.
Jesus, levantando os olhos ao Céu, disse:
«Pai, dou-Te graças por Me teres ouvido. Eu bem sei que sempre Me ouves,
mas falei assim por causa da multidão que nos cerca,
para acreditarem que Tu Me enviaste».
Dito isto, bradou com voz forte:
«Lázaro, sai para fora».
O morto saiu, de mãos e pés enfaixados com ligaduras
e o rosto envolvido num sudário.
Disse-lhes Jesus:
«Desligai-o e deixai-o ir».
Então muitos judeus, que tinham ido visitar Maria,
ao verem o que Jesus fizera, acreditaram n’Ele.
A questão principal do Evangelho deste domingo é a afirmação de que não há morte para os “amigos” de Jesus. Os “amigos” de Jesus experimentam a morte física, mas essa morte não é destruição e aniquilação total, mas apenas passagem para a vida definitiva junto de Deus. A história de Lázaro pretende representar esta realidade.
• No dia do nosso Baptismo, escolhemos essa vida plena e definitiva que Jesus nos ofereceu. Tem sido coerente a nossa vida com esta opção? A nossa existência não corresponderá tantas vezes com uma atitude egoísta e fechada, ou terá ela uma marca de amor, de partilha, de dom da vida, que aponta para a realização plena do homem e para a vida eterna?
• Ao longo da nossa existência, convivemos com situações em que somos tocados pela morte física daqueles a quem amamos… É natural que fiquemos tristes pela sua partida. A nossa fé convida-nos, no entanto, a ter a certeza de que os “amigos” apenas encontraram a vida definitiva, longe da debilidade e da finitude humanas.
• Diante da certeza que a fé nos dá, somos convidados a viver uma vida sem medo. O medo da morte como aniquilamento total torna o homem cauteloso e impotente face à opressão e ao poder dos opressores; mas libertando-nos do medo da morte, Jesus torna-nos livres e capacita-nos para gastar a vida ao serviço dos irmãos, lutando generosamente contra tudo aquilo que oprime e que rouba ao homem a vida plena.
Testemunho
«Disse Jesus: ‘Tirai a pedra’.» (Jo 11,39)
Depois de um incêndio numa floresta a morte ganha uma expressão visual tremenda. A aflição do fogo devorador dá lugar ao silêncio e ao coração apertado. Lembro-me de ter andado, há anos, pelo meio de cinzas e arbustos carbonizados depois um incêndio na serra da Arrábida. O céu azul e o sol pareciam envergonhados perante aquela desolação. Mas, de repente, por entre o negro e a cinza, junto a um tronco queimado, um rebento verde ousava desafiar aquele espectáculo de morte. Frágil, aparentemente impotente, era um grito de vida espantoso. Como me lembro tanto do poema do Sebastião da Gama que começa assim: “Que a Morte, quando vier, / não venha matar um morto”!
Há mortes e mortes, e cada uma é única, e todas nos incomodam. Não temos palavras para esses momentos. O abraço, as lágrimas, as mãos apertadas trocam-se em silêncio. Não é a presença a melhor palavra de amor e comunhão? Verdadeiramente não nos habituaremos à morte (e ainda bem, porque ela não é o nosso fim) mas como abraçamos a vida? Como juntamos forças para retirar as pedras que fazem sepulcros antes de tempo? O que fazemos para vencer o desânimo que deixa cair os braços ou fecha cada um no seu casulo? Que ressurreições estão ao nosso alcance?
Por entre a burocracia em que se transformou, por exemplo, muito do esforço de educar, há testemunhos de quem não se acomoda à exigência dos números ou dos papéis. Procuram “tirar as pedras” que encerram capacidades, energias, confiança, sonhos, valor próprio, de tantas crianças e jovens. Um de cada vez, à maneira de madre Teresa de Calcutá e de Jesus (que ligava pouco a números, excepto na compaixão por todos), aproximando-se com a delicadeza que a “raposa” ensinou ao “Principezinho”, talvez até sentando-se no chão em companhia inesperada, agem para evitar a ”morte anunciada” de meninos e meninas pouco amados. Não pedem nada em troca, dói-lhes apenas a “funcionalização” do educar, como se fosse mais uma pequena “morte”. Ressuscitar é acção de Deus, mas reanimar, restaurar a confiança, levantar quem caiu, promover quem é excluído, recriar a dignidade e o valor que cada pessoa tem, procurar em comum razões de esperança e de vida, tudo isto é tarefa nossa!
Gosto deste pedido de Jesus: “Tirai a pedra”! Ainda que “já cheire mal” (quando tudo já parece perdido), é preciso “ser vivo” até ao fim. Pedras de indiferença e exclusão, de egoísmo e autosuficiência. Pedras de dentro e de fora. Ressuscitar não é uma tarefa solitária: precisamos de Deus e também Ele precisa de nós!
P. Vítor Gonçalves
«Nós Te damos graças, Senhor, Pai Santo, por Cristo nosso Senhor,
O qual, homem mortal como nós que chorou pelo seu amigo Lázaro,
e Deus e Senhor da Vida que o levantou do sepulcro,
estende hoje a sua compaixão a todos os homens
e por meio dos sacramentos restaura-os para uma vida nova.»
Através da fé e do baptismo no teu Espírito,
chamaste-nos a uma esperança sólida,
de vida e ressurreição com Cristo.
Bendito sejais, Senhor!
Assim entendemos que somos seres para a Vida
que brota incomensurável do teu coração de Pai que nos ama.
A morte já não é o fim do caminho nem a última palavra,
porque Tu Jesus és ressurreição e vida para quem em Ti acredita.
Amen.
TU ÉS VIDA PARA AS NOSSAS MORTES
Tu também choras a morte de um amigo,
também Te doem as dificuldades da vida.
Tu sabes bem o que são maus momentos
e a força do amor para os suavizar.
Sabes também como nos deixamos abater perante as contrariedades
e perante as situações que não entendemos.
Precisamos de ter o controlo sobre as coisas,
os acontecimentos e as pessoas,
e sentir-nos tão vulneráveis nos assusta e desespera.
Dizes que se tivéssemos fé nada nos seria impossível,
mas a morte... não podemos entendê-la,
ultrapassa-nos e separa-nos dos nossos.
Queremos acreditar que, para lá de toda a situação dolorosa,
há vida, que nos encontraremos depois, na casa do Pai;
que somos finitos e, por isso,
devemos ir-nos separando uns dos outros
e que Tu nos ajudarás a superar a dor da separação.
A Marta e Maria não lhes devolveste só o irmão,
mas o alívio, a coragem e a vitalidade pessoal.
É isso que temos de saber deixar que faças em nós,
cada vez que vivemos uma morte,
uma dor, uma dificuldade aparentemente insuperável.
ConTigo a vida é muito mais suportável.
A Tua presença põe-nos em contacto com todos os recursos pessoais
e tira o que há de melhor nuns e noutros.
Põe em circulação o amor que nos facilita a vida,
que nos faz poder com o que é quase impossível.
Tu, Senhor, és bálsamo para as nossas feridas,
ressurreição para as nossas mortes,
saúde para as nossas doenças,
consolação para os nossos desamores,
aceitação para os nossos fracassos.
Tu robusteces a nossa parte de Marta e de Maria,
a nossa capacidade activa tanto como a contemplativa.
Tu ensinas-nos a ser amigos, companheiros,
a humanizar e consolar.
Põe palavras na nossa boca
para partilhar alegrias e penas,
para expressar o amor conTigo
e como Tu.
(Álvaro Ginel e Mari Ayerra)
IV Domingo da Quaresma A
As leituras deste Domingo continuam a catequese baptismal da Quaresma e definem a experiência cristã como “viver na luz”.
No Domingo passado, reflectimos no símbolo da água, com o episódio da Samaritana; hoje, a liturgia, com a cura do cego de nascença, prossegue o tema da luz; na próxima semana, com a ressurreição de Lázaro, meditaremos no tema da vida.
As Leituras deste Domingo propõem o tema da «luz» e apresentam a experiência cristã de vivermos na «luz».
A primeira leitura narra-nos a escolha de David para rei de Israel e descreve-nos a sua unção. (É um óptimo pretexto para reflectirmos sobre a unção que todos nós recebemos no dia do nosso Baptismo e que nos constituiu testemunhas da “luz” de Deus no mundo.)
S. Paulo, na segunda leitura, recorda-nos que no Baptismo o cristão passa das trevas para a Luz e aceita o convite de viver como filho da "Luz", praticando as obras de Deus. (Ef 5,8-14)
O Evangelho apresenta Jesus como a "Luz do Mundo", que veio libertar os homens das trevas. A cura do cego descreve o processo de fé de um homem, que vai passando das trevas da cegueira para a luz da visão e, desta, para a Luz da fé em Cristo. O "Cego" é um símbolo de toda a humanidade que vive na escuridão, privada da "luz", impedida de chegar à plenitude da vida.
Primeira Leitura (1 Sam 16,1b.6-7.10-13ª)
Leitura do Primeiro Livro de Samuel
Naqueles dias, o Senhor disse a Samuel:
«Enche o corno de óleo e parte.
Vou enviar-te a Jessé de Belém,
pois escolhi um rei entre os seus filhos».
Quando chegou, Samuel viu Eliab e pensou consigo:
«Certamente é este o ungido do Senhor».
Mas o Senhor disse a Samuel:
«Não te impressiones com o seu belo aspecto,
nem com a sua elevada estatura, pois não foi esse que Eu escolhi.
Deus não vê como o homem;
o homem olha às aparências, o Senhor vê o coração».
Jessé fez passar os sete filhos diante de Samuel,
mas Samuel declarou-lhe:
«O senhor não escolheu nenhum destes».
E perguntou a Jessé:
«Estão aqui todos os teus filhos?»
Jessé respondeu-lhe:
«Falta ainda o mais novo, que anda a guardar o rebanho».
Samuel ordenou: «Manda-o chamar,
porque não nos sentaremos à mesa, enquanto ele não chegar».
Então Jessé mandou-o chamar:
era loiro, de belos olhos e agradável presença.
O Senhor disse a Samuel:
«Levanta-te e unge-o, porque é este mesmo».
Samuel pegou no corno do óleo e ungiu-o no meio dos irmãos.
Dequele dia em diante, o Espírito do Senhor apoderou-Se de David.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 22 (23)
Refrão: O Senhor é meu pastor, nada me faltará
O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Leva-me a descansar em verdes prados,
conduz-me às águas refrescantes
e reconforta a minha alma.
Ele me guia por sendas direitas por amor do seu nome.
Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos,
não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo:
o vosso cajado e o vosso báculo me enchem de confiança.
Para mim preparais a mesa
à vista dos meus adversários;
com óleo me perfumais a cabeça
e meu cálice transborda.
A bondade e a graça hão-de acompanhar-me
todos os dias da minha vida,
e habitarei na casa do Senhor
para todo o sempre.
Segunda Leitura (Ef 5,8-14)
Leitura da Epístola do apóstolo S. Paulo aos Efésios
Irmãos:
Outrora vós éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor.
Vivei como filhos da luz,
porque o fruto da luz é a bondade, a justiça e a verdade.
Procurai sempre o que mais agrada ao Senhor.
Não tomeis parte nas obras das trevas, que são inúteis;
tratai antes de condená-las abertamente,
porque o que eles fazem em segredo
até é vergonhoso dizê-lo.
Mas, todas as coisas que são condenadas
são postas a descoberto pela luz,
e tudo que assim se manifesta torna-se luz.
É por isso que se diz:
«Desperta, tu que dormes; levanta-te do meio dos mortos
e Cristo brilhará sobre ti».
EVANGELHO – Jo 9,1-41
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo S. João
Naquele tempo,
Jesus encontrou no seu caminho um cego de nascença.
Os discípulos perguntaram-Lhe:
«Mestre, quem é que pecou para ele nasceu cego?
Ele ou os seus pais?
Jesus respondeu-lhes:
«Isso não tem nada que ver com os pecados dele ou dos pais;
mas aconteceu assim para se manifestarem nele as obras de Deus.
É preciso trabalhar, enquanto é dia,
nas obras d’Aquele que Me enviou.
Vai cegar a noite, em que ninguém pode trabalhar.
Enquanto Eu estou no mundo, sou a luz do mundo».
Dito isto, cuspiu em terra,
fez com a saliva um pouco de lodo e ungiu os olhos do cego.
Depois disse-lhe:
«Vai lavar-te à piscina de Siloé»; Siloé quer dizer «Enviado».
Ele foi, lavou-se e ficou a ver.
Entretanto, perguntavam os vizinhos e os que antes o viam a mendigar:
«Não é este o que costumava estar sentado a pedir esmola?»
Uns diziam: «É ele». Outros afirmavam: «Não é. É parecido com ele».
Mas ele próprio dizia: «Sou eu».
Perguntaram-lhe então:
«Como foi que se abriram os teus olhos?»
Ele respondeu:
«Esse homem, que se chama Jesus, fez um pouco de lodo,
ungiu-me os olhos e disse-me:
‘Vai lavar-te à piscina de Siloé’. Eu fui, lavei-me e comecei a ver».
Perguntaram-lhe ainda: «Onde está Ele?»
O homem respondeu: «Não sei».
Levaram aos fariseus o que tinha sido cego.
Era sábado esse dia em que Jesus fizeram lodo e lhe tinha aberto os olhos.
Por isso, os fariseus perguntaram ao homem como tinha recuperado a vista.
Ele declarou-lhes: «Jesus pôs-me lodo nos olhos;
depois fui lavar-me e agora vejo».
Diziam alguns dos fariseus:
«Esse homem não vem de Deus, porque não guarda o sábado».
Outros observavam:
«Como pode um pecador fazer tais milagres?»
E havia desacordo entre eles. Perguntaram então novamente ao cego:
«Tu que dizias d’Aquele que te deu a vista?»
O homem respondeu: «É um profeta».
Os judeus não quiseram acreditar que ele tinha sido cego e começara a ver.
Chamaram então os pais dele e perguntaram-lhes:
«É este o vosso filho? É verdade que nasceu cego?
Como é que agora vê?»
Os pais responderam:
«Sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego;
mas não sabemos como é que ele agora vê,
nem sabemos quem lhe abriu os olhos.
Ele já tem idade para responder: perguntai-lho vós».
Foi por medo que eles deram esta resposta,
porque os judeus tinham decidido expulsar da sinagoga
quem reconhecesse que Jesus era o Messias.
Por isso é que disseram:
«Ele já tem idade para responder; perguntai-lho vós».
Os judeus chamaram outra vez o que tinha sido curado
e disseram-lhe: «Dá glória a Deus.
Nós sabemos que esse homem é pecador».
Ele respondeu: «Se é pecador, não sei. O que sei é que eu era cego e agora vejo».
Perguntaram-lhe então:
«Que te fez Ele? Como te abriu os olhos?»
O homem replicou:
«Já vos disse e não destes ouvidos. Porque desejais ouvi-lo novamente?
Também quereis fazer-vos seus discípulos?»
Então insultaram-no e disseram-lhe:
«Tu é que és seu discípulo; nós somos discípulos de Moisés;
mas este, nem sabemos de onde é».
O homem respondeu-lhes:
«Isto é realmente estranho: não sabeis de onde Ele é,
mas a verdade é que Ele me deu a vista.
Ora, nós sabemos que Deus não escuta os pecadores,
mas escuta aqueles que O adoram e fazem a sua vontade.
Nunca se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos
a um cego de nascença.
Se Ele não viesse de Deus, nada podia fazer».
Replicaram-lhe então eles:
«Tu nasceste inteiramente em pecado e pretendes ensinar-nos?»
E expulsaram-no.
Jesus soube que o tinham expulsado e, encontrando-o, disse-lhe:
«Tu acreditas no Filho do homem?»
Ele respondeu-Lhe:
«Senhor, quem é Ele, para que eu acredite?»
Disse-lhe Jesus;
«Já O viste: é Quem está a falar contigo».
O homem prostrou-se diante de Jesus e exclamou:
«Eu creio, Senhor».
Então Jesus disse-lhe:
«Eu vim para exercer um juízo: os que não vêem ficarão a ver;
os que vêem ficarão cegos».
Alguns fariseus que estavam com Ele, ouvindo isto,
perguntaram-Lhe:
«Nós também somos cegos?»
Respondeu-lhes Jesus:
«Se fôsseis cegos, não teríeis pecado.
Mas como agora dizeis: ‘Não vemos’, o vosso pecado permanece».
• O que é que, no nosso mundo, gera escuridão, trevas, alienação, cegueira e morte? O que é que impede o homem de ser livre e de se realizar plenamente, conforme previa o projecto de Deus?
• A catequese que João nos propõe hoje garante-nos: a realização plena do homem continua a ser a prioridade de Deus. Jesus Cristo, o Filho de Deus, veio ao encontro dos homens e mostrou-lhes a luz libertadora: convidou-os a renunciar ao egoísmo e auto-suficiência que geram “trevas”, sofrimento, escravidão e a fazerem da vida um dom, por amor. Aderir a esta proposta é viver na “luz”. Como é que eu me situo face ao desafio que, em Jesus, Deus me faz?
• O Evangelho deste domingo descreve várias formas de responder negativamente à “luz” libertadora que Jesus oferece. Há aqueles que se opõem decididamente à proposta de Jesus porque estão instalados na mentira e a “luz” de Jesus só os incomoda; há aqueles que têm medo de enfrentar as “bocas”, as críticas, que se deixam manipular pela opinião dominante, e que, por medo, preferem continuar escravos do que arriscar ser livres; há aqueles que, apesar de reconhecerem as vantagens da “luz”, deixam que o comodismo e a inércia os prendam numa vida de escravos… Eu identifico-me com algum destes grupos?
• O cego que escolhe a “luz” e que adere incondicionalmente a Jesus e à sua proposta libertadora é o modelo que nos é proposto. A Palavra de Deus convida-nos, neste tempo de Quaresma, a um processo de renovação que nos leve a deixar tudo o que nos escraviza, nos aliena, nos oprime – no fundo, tudo o que impede que brilhe em nós a “luz” de Deus e que impede a nossa plena realização. Para que a celebração da ressurreição – na manhã de Páscoa – signifique algo, é preciso realizarmos esta caminhada quaresmal e renascermos, feitos Homens Novos, que vivem na “luz” e que dão testemunho da “luz”. O que é que eu posso fazer para que isso aconteça?
• Receber a “luz” que Cristo oferece é, também, acender a “luz” da esperança no mundo. O que é que eu faço para eliminar as “trevas” que geram sofrimento, injustiça, mentira e alienação? A “luz” de Cristo que os padrinhos me passaram no dia em que fui baptizado brilha em mim e ilumina o mundo?
Senhor!
Eu bem Te vejo, apesar
da escuridão!
Inda me não tocou a Tua Mão,
mas bem na sinto, bem na sinto em meus cabelos,
numa carícia igual a um perfume ou um perdão.
Senhor!
Eu bem Te vejo, apesar
da escuridão!
[…]
(Sebastião da Gama, “Ressurreição”, in Serra-Mãe)
Amigo dos olhos abertos!
Não sei como te chamar porque não nos chegou o teu nome mas o evangelista João deixou-nos um retrato teu que impressiona sempre que o escuto e ficou-me uma vontade de te escrever. Ao contrário de outros cegos dos evangelhos parece que não pediste nenhum milagre a Jesus. Não gritaste nem se ouviu a tua voz. Talvez nem tivesses ouvido falar dele. De facto foi Jesus que te encontrou no caminho e depois de tentar libertar as mentes dos discípulos do preconceito de que a doença e o sofrimento eram castigo dos pecados, pôs-te "na berlinda". Deves ter ficado surpreendido com aquele lodo feito de saliva e terra que Ele te pôs nos olhos e com a ordem para te ires lavar à piscina de Siloé. E foste, e ainda bem que foste!
Gostava tanto de te ouvir contar como foi o teu abrir de olhos e começares a ver! Sabes, às vezes, andamos com os olhos desfocados ou cheios de escamas que já nem nos maravilhamos com o dom de ver. Como se andássemos doentes dos olhos e só vemos o que é feio, o mal dos outros e do mundo, a escuridão. Imagino o teu olhar como o das crianças, encantado com tudo, maravilhado com o insignificante e com o grandioso, espantado quando viste o teu rosto pela primeira vez e o daqueles que só conhecias pela voz, pelas mãos. Estavas a nascer de novo! E como isso te transformou. Já não fazia sentido pedir esmola mas era preciso dizer que eras o mesmo e também outro. No meio de acesa polémica foste questionado, levado aos fariseus, quiseram manipular-te, insultaram-te, mas foi crescendo em ti uma voz, uma coragem para até ironizar com os que te julgavam. Não aceitavam que tivesses nascido "inteiramente em pecado" e estivesses a ensiná-los! Continuamos a ter dificuldade em acolher as surpresas de Deus. É tão fácil espalhar o preconceito e viver em condomínios fechados do pensamento. Julgamos ver melhor e talvez estejamos cegos para o essencial. Mas também há modos refinados de prolongar "cegueiras", de esconder verdades, de manipular pessoas e multidões. Na política, na economia e até na fé há "sábados" intocáveis de inércia e acomodamento, de poderes apetecíveis, de tradições vazias, de injustiças prolongadas. Continua a ser verdade: "o pior cego é aquele que não quer ver".
Mas foi o olhar de Jesus que mais te impressionou, não foi? Há uma canção brasileira que diz assim "Quando a luz dos olhos meus e a luz dos olhos teus resolvem-se encontrar... ". Ver e acreditar foi um enorme passo. Como se transformou o teu caminho? Como se transformam os nossos que também acreditamos em Jesus? Pode ver-se nos nossos olhos a luz que passou a habitar os teus? Obrigado pela tua paciência em me leres.
Um abraço a Jesus e vemo-nos por aí!
P. Vítor Gonçalves
III Domingo da Quaresma A
A Quaresma, na Igreja primitiva, além de ser um tempo de penitência e de conversão, era um tempo de preparação para os baptizados, que aconteciam no sábado santo, na Vigília Pascal. Por isso, nestes três domingos, que antecedem a semana santa, aparece o tema baptismal com os símbolos da Água, no diálogo com a Samaritana; da Luz, na cura do cego; da Vida, na ressurreição de Lázaro. Hoje temos o símbolo da Água, que exprime o milagre renovado da vida.
O Evangelho também não se afasta desta temática… Garante-nos que, através de Jesus, Deus oferece ao homem a felicidade (não a felicidade ilusória, parcial e falível, mas a vida eterna). Quem acolhe o dom de Deus e aceita Jesus como “o salvador do mundo” torna-se um Homem Novo, que vive do Espírito e que caminha ao encontro da vida plena e definitiva.
Primeira Leitura (Ex 17,3-7)
Leitura do Livro do Êxodo
Naqueles dias, o povo israelita, atormentado pela sede,
começou a altercar com Moisés, dizendo:
«Porque nos tiraste do Egipto? Para nos deixares morrer à sede,
a nós, aos nossos filhos e aos nossos rebanhos?»
Então Moisés clamou ao Senhor, dizendo:
«Que hei de fazer a este povo? Pouco falta para me apedrejarem».
O Senhor respondeu a Moisés:
«Passa para a frente do povo e leva contigo alguns anciãos de Israel.
Toma na mão a vara com que fustigaste o rio e põe te a caminho.
Eu estarei diante de ti, sobre o rochedo, no monte Horeb.
Baterás no rochedo e dele sairá água; então o povo poderá beber».
Moisés assim fez à vista dos anciãos de Israel.
E chamou àquele lugar Massa e Meriba,
por causa da altercação dos filhos de Israel
e por terem tentado o Senhor, ao dizerem:
«O Senhor está ou não no meio de nós?»
Salmo Responsorial – Salmo 94 (95)
Refrão: Se hoje ouvirdes a voz do Senhor,
não fecheis os vossos corações.
Vinde, exultemos de alegria no Senhor,
aclamemos a Deus nosso salvador.
Vamos à sua presença e dêmos graças,
ao som de cânticos aclamemos o Senhor.
Vinde, prostremo-nos em terra,
adoremos o Senhor que nos criou.
Pois Ele é o nosso Deus
e nós o seu povo, as ovelhas do seu rebanho.
Quem dera ouvísseis hoje a sua voz:
«Não endureçais os vossos corações,
como em Meriba, como no dia de Massa no deserto,
onde vossos pais Me tentaram e provocaram,
apesar de terem visto as minhas obras.
Segunda Leitura (Rom 5,1-2.5-8)
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
Irmãos: tendo sido justificados pela fé,
estamos em paz com Deus, por Nosso Senhor Jesus Cristo,
pelo qual temos acesso, na fé,
a esta graça em que permanecemos e nos gloriamos,
apoiados na esperança da glória de Deus.
Ora, a esperança não engana,
porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações
pelo Espírito Santo que nos foi dado.
Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores.
Dificilmente alguém morre por um justo;
por um homem bom, talvez alguém tivesse a coragem de morrer.
Deus prova assim o seu amor para connosco:
Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores.
EVANGELHO – (Jo 4,5-42)
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
Naquele tempo,
chegou Jesus a uma cidade da Samaria, chamada Sicar,
junto da propriedade que Jacob tinha dado a seu filho José,
onde estava a fonte de Jacob.
Jesus, cansado da caminhada, sentou Se à beira do poço.
Era por volta do meio dia. Veio uma mulher da Samaria para tirar água.
Disse lhe Jesus: «Dá-Me de beber».
Os discípulos tinham ido à cidade comprar alimentos.
Respondeu-Lhe a samaritana:
«Como é que Tu, sendo judeu, me pedes de beber, sendo eu samaritana?»
De facto, os judeus não se dão com os samaritanos.
Disse lhe Jesus:
«Se conhecesses o dom de Deus e quem é Aquele que te diz: ‘Dá-Me de beber’,
tu é que Lhe pedirias e Ele te daria água viva».
Respondeu-Lhe a mulher:
«Senhor, Tu nem sequer tens um balde, e o poço é fundo:
donde Te vem a água viva? Serás Tu maior do que o nosso pai Jacob,
que nos deu este poço, do qual ele mesmo bebeu, com os seus filhos a os seus rebanhos?»
Disse-Lhe Jesus:
«Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede.
Mas aquele que beber da água que Eu lhe der nunca mais terá sede:
a água que Eu lhe der tornar se á nele uma nascente que jorra para a vida eterna».
«Senhor, suplicou a mulher dá-me dessa água, para que eu não sinta mais sede
e não tenha de vir aqui buscá-la».
Vejo que és profeta. Os nossos pais adoraram neste monte
e vós dizeis que é em Jerusalém que se deve adorar».
Disse lhe Jesus:
«Mulher, podes acreditar em Mim: Vai chegar a hora em que nem neste monte
nem em Jerusalém adorareis o Pai.
Vós adorais o que não conheceis;
nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus.
Mas vai chegar a hora – e já chegou – em que os verdadeiros adoradores
hão de adorar o Pai em espírito a verdade, pois são esses os adoradores que o Pai deseja.
Deus é espírito e os seus adoradores devem adorá-l’O em espírito e verdade».
Disse-Lhe a mulher:
«Eu sei que há de vir o Messias, isto é, Aquele que chamam Cristo.
Quando vier há de anunciar nos todas as coisas».
Respondeu-lhe Jesus:
«Sou Eu, que estou a falar contigo».
Muitos samaritanos daquela cidade acreditaram em Jesus, por causa da palavra da mulher.
Quando os samaritanos vieram ao encontro de Jesus,
pediram-Lhe que ficasse com eles. E ficou lá dois dias.
Ao ouvi-l’O, muitos acreditaram e diziam à mulher:
«Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos.
Nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é realmente o Salvador do mundo».
ORAÇÃO UNIVERSAL
Sacerdote: Irmãos e irmãs em Cristo: Com o ardor da nossa sede de Deus, peçamos a Jesus Cristo que dê à sua Igreja e ao mundo inteiro a água viva que jorra para a eternidade, dizendo, confiadamente:
Todos: Renovai-nos, Senhor, com a vossa graça.
1. Pela Igreja, por esta Diocese de Lisboa e suas comunidades, para que o Senhor lhes dê a água viva e as torne fonte de graça e de perdão, oremos, irmãos.
2. Pelos responsáveis e governantes deste mundo, para que o Senhor lhes dê a água viva e faça deles homens de paz e de justiça, oremos, irmãos.
3. Pelos órfãos, as viúvas e todos os que sofrem, para que o Senhor lhes dê a água viva, os proteja, lhes dê alívio e os conforte, oremos, irmãos.
4. Pelos catecúmenos que caminham para a Páscoa, para que o Senhor lhes dê a água viva e os ensine a perdoar e a repartir, oremos, irmãos.
5. Por todos nós aqui reunidos em assembleia, para que o Senhor nos dê a água viva e não deixe que fechemos os nossos corações, oremos, irmãos.
Sacerdote: Senhor, nosso Deus e nosso Pai, fazei-nos encontrar em Jesus Cristo a fonte da água viva, onde a nossa sede de justiça e de santidade se pode saciar em plenitude. Ele que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
O Poço de Jacob
Hoje fui novamente ao Poço de Jacob
tirar água para a minha sede.
Sentado na beira do Poço,
encontrei um HOMEM
que quis beber da minha água.
– Era uma água suja aquela que eu bebia
e oferecia à gente da minha cidade.
Mas hoje, no Poço de Jacob,
permiti que o Messias falasse comigo.
Aquele olhar, penetrante e bom,
leu no mais fundo do meu coração
e disse tudo quanto eu fiz.
Junto daquele Poço
compreendi o vazio da minha vida,
senti sede no meu espírito...
Coloquei nas mãos de Jesus
esta frágil bilha de argila.
Ele encheu-a de água pura,
a transbordar...
No Poço de Jacob
bebi as palavras e os gestos de Jesus
e tornei-me nascente de Água Viva
a jorrar para a vida eterna.
Por minha causa
muitos habitantes da cidade
hão-de acreditar também em Jesus.