Missão é partir
Missão é partir, caminhar, sair de si. É quebrar as crostas do egoísmo
É quebrar as crostas do egoísmo
que nos fecha no nosso eu!
Missão é parar de dar voltas ao redor de nós mesmos
como se fôssemos o centro do mundo, da vida.
Missão é não deixar bloquear nos problemas
do pequeno mundo a que pertencemos.
A Humanidade é maior.
Missão é sempre partir,
mas não devorar quilómetros.
É sobretudo abrir-se aos outros como irmãos,
descobri-los e encontrá-los.
E para os descobrir e amar
é necessário atravessar mares
e voar pelos céus,
então, missão é partir até aos confins do mundo!
D. HÉLDER CÂMARA
Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor

Homilia do Papa Francisco
XXVIII Jornada Mundial da Juventude
1. Jesus entra em Jerusalém. A multidão dos discípulos acompanha-O em festa, os mantos são estendidos diante d'Ele, fala-se dos prodígios que realizou, ergue-se um grito de louvor: «Bendito seja o Rei que vem em nome do Senhor! Paz no céu e glória nas alturas!» (Lc 19, 38).
Multidão, festa, louvor, bênção, paz: respira-se um clima de alegria. Jesus despertou tantas esperanças no coração, especialmente das pessoas humildes, simples, pobres, abandonadas, pessoas que não contam aos olhos do mundo. Soube compreender as misérias humanas, mostrou o rosto misericordioso de Deus e inclinou-Se para curar o corpo e a alma.
Assim é Jesus. Assim é o seu coração, que nos vê a todos, que vê as nossas enfermidades, os nossos pecados. Grande é o amor de Jesus! E entra em Jerusalém assim com este amor que nos vê a todos. É um espectáculo lindo: cheio de luz – a luz do amor de Jesus, do amor do seu coração –, de alegria, de festa.
No início da Missa, também nós o reproduzimos. Agitámos os nossos ramos de palmeira. Também nós acolhemos Jesus; também nós manifestamos a alegria de O acompanhar, de O sentir perto de nós, presente em nós e no nosso meio, como um amigo, como um irmão, mas também como rei, isto é, como farol luminoso da nossa vida. Jesus é Deus, mas desceu a caminhar connosco como nosso amigo, como nosso irmão; e aqui nos ilumina ao longo do caminho. E assim hoje O acolhemos. E aqui temos a primeira palavra que vos queria dizer: alegria! Nunca sejais homens e mulheres tristes: um cristão não o pode ser jamais! Nunca vos deixeis invadir pelo desânimo! A nossa alegria não nasce do facto de possuirmos muitas coisas, mas de termos encontrado uma Pessoa: Jesus, que está no meio de nós; nasce do facto de sabermos que, com Ele, nunca estamos sozinhos, mesmo nos momentos difíceis, mesmo quando o caminho da vida é confrontado com problemas e obstáculos que parecem insuperáveis... e há tantos! E nestes momentos vem o inimigo, vem o diabo, muitas vezes disfarçado de anjo, e insidiosamente nos diz a sua palavra. Não o escuteis! Sigamos Jesus! Nós acompanhamos, seguimos Jesus, mas sobretudo sabemos que Ele nos acompanha e nos carrega aos seus ombros: aqui está a nossa alegria, a esperança que devemos levar a este nosso mundo. E, por favor, não deixeis que vos roubem a esperança! Não deixeis roubar a esperança... aquela que nos dá Jesus!
2. Segunda palavra. Para que entra Jesus em Jerusalém? Ou talvez melhor: Como entra Jesus em Jerusalém? A multidão aclama-O como Rei. E Ele não Se opõe, não a manda calar (cf. Lc 19, 39-40). Mas, que tipo de Rei seria Jesus? Vejamo-Lo... Monta um jumentinho, não tem uma corte como séquito, nem está rodeado de um exército como símbolo de força. Quem O acolhe são pessoas humildes, simples, que possuem um sentido para ver em Jesus algo mais; têm o sentido da fé que diz: Este é o Salvador. Jesus não entra na Cidade Santa, para receber as honras reservadas aos reis terrenos, a quem tem poder, a quem domina; entra para ser flagelado, insultado e ultrajado, como preanuncia Isaías na Primeira Leitura (cf. Is 50, 6); entra para receber uma coroa de espinhos, uma cana, um manto de púrpura (a sua realeza será objecto de ludíbrio); entra para subir ao Calvário carregado com um madeiro. E aqui temos a segunda palavra: Cruz. Jesus entra em Jerusalém para morrer na Cruz. E é precisamente aqui que refulge o seu ser Rei segundo Deus: o seu trono real é o madeiro da Cruz! Vem-me à mente aquilo que Bento XVI dizia aos Cardeais: Vós sois príncipes, mas de um Rei crucificado. Tal é o trono de Jesus. Jesus toma-o sobre Si... Porquê a Cruz? Porque Jesus toma sobre Si o mal, a sujeira, o pecado do mundo, incluindo o nosso pecado, o pecado de todos nós, e lava-o; lava-o com o seu sangue, com a misericórdia, com o amor de Deus. Olhemos ao nosso redor... Tantas feridas infligidas pelo mal à humanidade: guerras, violências, conflitos económicos que atingem quem é mais fraco, sede de dinheiro, que depois ninguém pode levar consigo, terá de o deixar. A minha avó dizia-nos (éramos nós meninos): a mortalha não tem bolsos. Amor ao dinheiro, poder, corrupção, divisões, crimes contra a vida humana e contra a criação! E também – como bem o sabe e conhece cada um de nós - os nossos pecados pessoais: as faltas de amor e respeito para com Deus, com o próximo e com a criação inteira. E na cruz, Jesus sente todo o peso do mal e, com a força do amor de Deus, vence-o, derrota-o na sua ressurreição. Este é o bem que Jesus realiza por todos nós sobre o trono da Cruz. Abraçada com amor, a cruz de Cristo nunca leva à tristeza, mas à alegria, à alegria de sermos salvos e de realizarmos um bocadinho daquilo que Ele fez no dia da sua morte.
3. Hoje, nesta Praça, há tantos jovens. Desde há 28 anos que o Domingo de Ramos é a Jornada da Juventude! E aqui aparece a terceira palavra: jovens! Queridos jovens, vi-vos quando entráveis em procissão; imagino-vos fazendo festa ao redor de Jesus, agitando os ramos de oliveira; imagino-vos gritando o seu nome e expressando a vossa alegria por estardes com Ele! Vós tendes um parte importante na festa da fé! Vós trazeis-nos a alegria da fé e dizeis-nos que devemos viver a fé com um coração jovem, sempre: um coração jovem, mesmo aos setenta, oitenta anos! Coração jovem! Com Cristo, o coração nunca envelhece. Entretanto todos sabemos – e bem o sabeis vós – que o Rei que seguimos e nos acompanha, é muito especial: é um Rei que ama até à cruz e nos ensina a servir, a amar. E vós não tendes vergonha da sua Cruz; antes, abraçai-la, porque compreendestes que é no dom de si, no dom de si, no sair de si mesmo, que se alcança a verdadeira alegria e que com o amor de Deus Ele venceu o mal. Vós levais a Cruz peregrina por todos os continentes, pelas estradas do mundo. Levai-la, correspondendo ao convite de Jesus: «Ide e fazei discípulos entre as nações» (cf. Mt 28, 19), que é o tema da Jornada da Juventude deste ano. Levai-la para dizer a todos que, na cruz, Jesus abateu o muro da inimizade, que separa os homens e os povos, e trouxe a reconciliação e a paz. Queridos amigos, na esteira do Beato João Paulo II e de Bento XVI, também eu, desde hoje, me ponho a caminho convosco. Já estamos perto da próxima etapa desta grande peregrinação da Cruz. Olho com alegria para o próximo mês de Julho, no Rio de Janeiro. Vinde! Encontramo-nos naquela grande cidade do Brasil! Preparai-vos bem, sobretudo espiritualmente, nas vossas comunidades, para que o referido Encontro seja um sinal de fé para o mundo inteiro. Os jovens devem dizer ao mundo: é bom seguir Jesus; é bom andar com Jesus; é boa a mensagem de Jesus; é bom sair de nós mesmos para levar Jesus às periferias do mundo e da existência. Três palavras: alegria, cruz, jovens.
Peçamos a intercessão da Virgem Maria. Que Ela nos ensine a alegria do encontro com Cristo, o amor com que O devemos contemplar ao pé da cruz, o entusiasmo do coração jovem com que O devemos seguir nesta Semana Santa e por toda a nossa vida. Assim seja.
Quando (não) comer é uma oração
Na Quarta-feira [de Cinzas], os católicos começam um tempo de exercícios espirituais a que chamam Quaresma. Começam-no de uma forma, no mínimo, curiosa: com um dia de jejum (que voltam a replicar na Sexta-Feira Santa).
O que está em causa no jejum é a possibilidade de nos interrogarmos sobre algo mais fundo: aquilo que nos serve de alimento e a voracidade sonâmbula com que vivemos. Pois, como lembrava José Augusto Mourão, «há em nós um desejo de ser ou de viver que nenhum alimento do mundo pode saciar. O que é desejado em nós não são tanto os objetos de que parecia termos necessidade mas aquilo que subjaz ao fundo de que vivemos, o dom da vida».
É com isso precisamente que o jejum dialoga. Nos seus traços bíblicos e cristãos, o jejum não é uma simples desintoxicação da bulimia em que estamos mergulhados, mas um modo, ao mesmo tempo simbólico e real, de exprimir que o verdadeiro alimento da nossa vida é outro, está noutra parte. Desta forma, somos chamados a tomar o jejum como lugar de um reencontro espiritual autêntico — e isto através de uma aprendizagem da conversão. É na medida em que o crente aprofunda o amor indefetível de Deus que poderá aceitar o risco e a exigência de um compromisso assim vital.
Na sua simbólica política (que evidentemente tem, não o esqueçamos), o jejum é também uma contestação declarada a uma cultura que identifica no consumo a sua promessa de felicidade e que promove essa procura no modo egocêntrico mais básico. O jejum é um posicionamento face aos tráficos de desejo que cada um traz alojados dentro de si. A vida cristã é uma economia de resistência e de combate. O jejum deve tornar-se um compromisso ativo em vista de uma transformação das estruturas opressivas de um mundo que, por exemplo, na sua organização atual patrocina o desfrutamento devorante das fontes do planeta.
O jejum, porém, só encontra a sua legibilidade quando nos reaproxima dos outros, recolocando-nos a operar num horizonte comunitário e relançando as nossas competências relacionais. É na medida em que o crente solidamente ancora a sua prática na relação que poderá aceder verdadeiramente à significação do jejum: renúncia à atitude solipsista das várias tipologias de consumo em vista da sobriedade, da condivisão, da solidariedade e do dom.
O jejum tem de inspirar uma nova qualidade e um novo estilo de relação, afastando-nos quer das práticas predatórias e suas quotidianas insinuações, quer da indiferença determinada pela busca obsidiante do proveito próprio. Lembra o monge português Carlos Maria Antunes, num oportuníssimo livro agora publicado («Só o Pobre Se Faz Pão», Paulinas Editora, 2013): 
«O jejum deixa-nos indefesos, confrontados com a nossa nudez, libertando-nos da tirania das máscaras e expondo a pobreza radical que habita cada ser humano. Revela que a nossa fome não é só de pão e que o nosso desejo mais profundo é sempre desejo do outro. Ampliando o nosso espaço interior, transforma-se numa forma singular de hospitalidade, que permite o acolhimento de si próprio e do outro, na sua mais genuína originalidade verdade».
Pe. José Tolentino Mendonça,
in Revista [Expresso], 2 de fevereiro de 2013
O silêncio, o grito e o canto
No mar vivem os peixes – e são mudos;
os animais, na terra, gritam;
mas os pássaros, cujo espaço vital é o céu, cantam.
O homem, porém, participa de todos três:
tem em si a profundidade do mar,
o peso da terra
e a altitude do céu.
Por isso, 
lhe pertencem também todas as três qualidades:
o silêncio, o grito e o canto.
A menina de Deus2
 
  
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
														
															 
														
										 
  
														
										







