Eis o coração que tanto amou os homens!
Em Vós está a fonte da vida!
«Considera, ó homem redimido, quem é Aquele que por ti está pregado na cruz, qual a sua dignidade e grandeza. A sua morte dá vida aos mortos; na sua morte, choram os céus e a terra e fendem-se até os rochedos mais duros.
Para que do lado de Cristo morto na cruz se formasse a Igreja e se cumprisse a palavra da Escritura que diz: Hão-de olhar para Aquele que trespassaram (Jo 19, 37), a divina providência permitiu que um dos soldados Lhe abrisse com a lança o lado sacrossanto e dele fizesse brotar sangue e água. Este é o preço da nossa salvação, saído daquela divina fonte, isto é, do íntimo do seu Coração, para dar aos sacramentos da Igreja o poder de conferir a vida da graça e se tornar para aqueles que vivem em Cristo uma fonte de água viva que jorra para a vida eterna. (Jo 4,14)
Levanta-te, tu que amas a Cristo, sê como a pomba que faz o seu ninho na alta caverna do rochedo (Jer 48,28), e aí, como o pássaro que encontrou a sua morada (Sl 83.4), não cesses de estar vigilante; aí esconde como a rola os filhos nascidos do casto amor; aí, aproxima os teus lábios para beber a água viva das fontes do Salvador (Is 12,3). Porque esta é a fonte que brota do meio do paraíso e, dividida em quatro rios (Gn 2,10), se derrama nos corações dos fiéis para irrigar e fecundar toda a terra.
Acorre a esta fonte de vida e de luz com toda a confiança, quem quer que sejas tu, ó alma consagrada a Deus, e exclama com todas as forças do teu coração:
Oh inefável beleza do Deus Altíssimo, esplendor puríssimo da luz eterna, vida que vivifica toda a vida, luz que ilumina toda a luz e conserva em fulgor perpétuo a multidão dos astros, que desde a primeira aurora resplandecem diante do trono da vossa divindade!
Oh eterno e inacessível, límpido e doce manancial daquela fonte que está escondida aos olhos de todos os mortais! Sois profundidade sem fundo, altura sem limites, vastidão sem medida, pureza sem mancha.
De ti procede o rio que alegra a cidade de Deus (Sl 45,5), para que, entre vozes de louvor e alegria da multidão em festa (Sl 41,5), possamos cantar hinos de louvor ao vosso nome, sabendo por experiência que em Vós está a fonte da vida e na vossa luz veremos a luz (Sl 35,10).»
São Boaventura [séc. XIII),
Opusculum 3, Árvore da Vida, 29-30.47; Opera omnia 8,79