Devo este impulso à inspiração que em mim despertou o falecimento de Maria José Nogueira Pinto (1952-2011).
Poderá, porventura, parecer insólito, tal como a enorme dignidade que revestiu a sua morte. Por múltiplas razões, a sua personalidade multifacetada constitui objecto da minha profunda admiração.
Maria José Nogueira Pinto derrotou, com a sua vida, a pejorativa conotação atribuída pelo senso comum ao espaço político dito de direita. Nascendo numa família aristocrata de convicções políticas vincadíssimas, defensora acérrima do modelo Deus-Pátria-Família, não se deixou deslumbrar pela sua condição social, entrando no campo de batalha para pôr em prática o verdadeiro combate em prol da solidariedade. Sem abdicar dos valores ditos tradicionais e com convicções emergentes de uma Fé profunda no Amor de Cristo, cumpriu exemplarmente a interpelação do saudoso João Paulo II — "Não tenhais medo".
A sua vida foi entregue ao serviço público, quer pelo desempenho de cargos de responsabilidade em instituições tão distintas como a Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa ou a Maternidade Alfredo da Costa, quer pela sua intervenção política mais activa, como líder parlamentar do CDS/PP e, recentemente, deputada independente eleita pelo Partido Social Democrata, cargo que ocupou estoicamente até à morte, tendo inclusivamente participado na eleição da actual Presidente da Assembleia da República.
Mulher de fibra, Maria José Nogueira Pinto transparecia verticalidade e firmeza, sendo elogiada por personalidades de todos os quadrantes político-partidários. Não obstante, a sua vida foi atribulada, preenchida com exílios políticos e outras provações. Todavia, como Senhor foi sempre o seu Pastor — citando a própria — nada lhe faltou mesmo quando faltava tudo. A profundidade da sua Fé foi o que mais me surpreendeu, embora ter Fé não seja ter mérito, mas sim possuir a Graça de Deus. Mas mesmo tendo Fé, quantos de nós não vacilam, hesitam e questionam a própria existência de Deus quando um pequeno infortúnio trava o nosso projecto de vida? Contudo, só essa mesma Fé a permitiu travar com tanta coragem o combate pessoal contra o "inimigo subtil, silencioso, traiçoeiro", o cancro pancreático. Esperando o pior mas confiando sempre no melhor, Maria José Nogueira Pinto faleceu vencendo o seu inimigo, pois como a própria escreveu poucas horas antes de perecer, "seja qual for o desfecho, como o Senhor é meu pastor, nada me faltará".