PARÓQUIA S. MIGUEL DE QUEIJAS

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Duas crónicas de Maria José Nogueira PintoMJPinto

Nova York    [DN, 03-03-2011]

Está sol, o céu despejado e, apesar de tudo o que nos rodeia, o ar é fresco e limpo. Entramos em Central Park à altura da 58th Street, atravesso grandes extensões de neve, o sol reflecte-se nas fachadas espelhadas dos sky lines e é devolvido, como num jogo de luzes, às superfícies de água gelada onde se amontoam patos friorentos. O caminho é sempre o mesmo, até chegar ao Plaza, cruzando novayorkinos que correm seminus, senhoras elegantes que passeiam cães gordos com capinhas de peles, famílias em bicicleta, alguns velhotes sentados nos bancos. Em cada banco, oferta dos cidadãos à cidade, uma pequena placa com uma inscrição é como que um recordatório: "Em memória da minha filha Katlheen e das nossas longas conversas nos bancos de Central Park." E vejo os esquilos e os pardais empanturrados de migalhas de tanto desperdício alimentar. O mayor acaba de anunciar a proibição de se fumar dentro do parque com o que o transformou, definitivamente, numa instituição.

Recordo-me, há mais de trinta anos, da primeira vez que passeei por aqui, em direcção ao emblemático Dakota onde cheguei no meio de grande agitação, carros de polícia, ambulâncias, os sons estridentes da desgraça, sirenes, apitos, as fitas amarelas da cena do crime vedando todos os acessos. Horas mais tarde soube que John Lennon, essa outra grandiosa instituição, tinha sido assassinado minutos antes da minha chegada. Nova York é assim mesmo... E cá estou eu, no meio do parque, no meio da minha vida, no meio do tempo subtraído ao tempo que me coube, para trás quanta memória, para a frente só imaginação, um momento suspenso naquele tempo e espaço, com sol, neve e os clichés invejáveis das cidades mil vezes filmadas, mil vezes descritas e cenariadas, passo mesmo por aquela curva apertada entre maciços que vai dar ao túnel onde, série sim, série não, aparece um cadáver de um sem-abrigo ou de uma ioguista.

Vamos ao Soho, só para ver aquelas lojas lindas como cenários de ópera, aquela animação ritmada como um musical, a mistura de locais e itinerantes, de vizinhança e babilónia. Entramos numa pequena boutique de roupa de criança, onde uma senhora pachorrenta nos impõe mil e um limites, explicando-nos que não podemos desarrumar nada. Questionada sobre a lógica desses limites acaba por revelar-se: "You now miss, Americans are full of rules. I came from Ethiopia more than 35 years ago and still I don't have a single american friend. I desperately wanna go back to my country."  Esta mulher também é uma instituição - representa os duros limites da terra de quase todas as oportunidades.

Fim de tarde no National Gallery para ver uma minúscula exposição construída em torno do quadro The Card Players, de Paul Cézanne. Um dos luxos de Nova York, onde existe tudo e o que não existe é rapidamente inventado, é o requinte com que o detalhe pode ser trabalhado. Também na Neue Galerie assistimos a uma exposição sobre o nascimento do estilo modernista em Viena (1900). Percebemos como a consciência da mudança — de estilo e de identidade — resulta de um e num processo interdisciplinar, afectando cenários, perspectivas e hábitos.

No domingo assistimos à Missa na Catedral de St. Patrick. A igreja está cheia de fiéis num ambiente de festa: os sons poderosos do órgão e as vozes belíssimas do coro, as velas e as flores. Chegada a homilia, o arcebispo de Nova York toma a palavra, em sentido literal, ocupa todo o espaço do altar-mor e, passeando de um lado para o outro, faz connosco uma profunda reflexão sobre a diferença entre preocupação e compromisso na manifestação da nossa fé. Nesta diferença está talvez um dos mais radicais desafios que nos é proposto, que é a entrega de tudo aquilo que — ao limite — não depende de nós. Talvez seja esta a chave para as caminhadas mais duras. Uma entrega que não é derrotista, mas confiante de quem sabe que — at the end of the day — não tem nada a temer.

Maria José Nogueira Pinto


Nada me faltará   [DN, 07-07-2011]

Acho que descobri a política — como amor da cidade e do seu bem — em casa. Nasci numa família com convicções políticas, com sentido do amor e do serviço de Deus e da Pátria. O meu Avô, Eduardo Pinto da Cunha, adolescente, foi combatente monárquico e depois emigrado, com a família, por causa disso. O meu Pai, Luís, era um patriota que adorava a África portuguesa e aí passava as férias a visitar os filiados do LAG. A minha Mãe, Maria José, lia-nos a mim e às minhas irmãs a Mensagem de Pessoa, quando eu tinha sete anos. A minha Tia e madrinha, a Tia Mimi, quando a guerra de África começou, ofereceu-se para acompanhar pelos sítios mais recônditos de Angola, em teco-tecos, os jornalistas estrangeiros. Aprendi, desde cedo, o dever de não ignorar o que via, ouvia e lia.

Aos dezassete anos, no primeiro ano da Faculdade, furei uma greve associativa. Fi-lo mais por rebeldia contra uma ordem imposta arbitrariamente (mesmo que alternativa) que por qualquer outra coisa. Foi por isso que conheci o Jaime e mudámos as nossas vidas, ficando sempre juntos. Fizemos desde então uma família, com os nossos filhos — o Eduardo, a Catarina, a Teresinha — e com os filhos deles. Há quase quarenta anos.

Procurei, procurámos, sempre viver de acordo com os princípios que tinham a ver com valores ditos tradicionais — Deus e a Pátria —, mas também com a justiça e com a solidariedade em que sempre acreditei e acredito. Tenho tentado deles dar testemunho na vida política e no serviço público. Sem transigências, sem abdicações, sem meter no bolso ideias e convicções.

Convicções que partem de uma fé profunda no amor de Cristo, que sempre nos diz — como repetiu João Paulo II — "não tenhais medo". Graças a Deus nunca tive medo. Nem das fugas, nem dos exílios, nem da perseguição, nem da incerteza. Nem da vida, nem na morte. Suportei as rodas baixas da fortuna, partilhei a humilhação da diáspora dos portugueses de África, conheci o exílio no Brasil e em Espanha. Aprendi a levar a pátria na sola dos sapatos.

Como no salmo, o Senhor foi sempre o meu pastor e por isso nada me faltou — mesmo quando faltava tudo.

Maria José Nogueira Pinto

Maria José Nogueira Pinto faleceu MJNPno dia 6 de Julho, com 59 anos de idade, vítima de cancro do pâncreas. Foi deputada entre 1995 e 1999, eleita pelo CDS-PP, e depois entre 2009 até à data, mas pelo PSD. Na actual legislatura esteve presente nas duas primeiras sessões plenárias, referentes à eleição da presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves.

Jurista de formação, foi ainda subsecretária de Estado da Cultura do XII Governo Constitucional, dirigido por Cavaco Silva, provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, membro da direcção da Maternidade Alfredo da Costa e vereadora da autarquia de Lisboa. Foi a sepultar no dia 8 de Julho de 2011, em A-dos-Negros .

Álvaro Laborinho Lúcio recorda-a como "uma mulher muito sensível, muito inteligente e muito firme na defesa das suas ideias" que, na vida política, "deu sempre o grande gosto" de poder ser vista "como uma mulher de uma grande seriedade e de uma grande honestidade".

Paz à sua alma e que o Bom Pastor a receba na Sua morada de luz e de paz.

 

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