«Vejo o meu Senhor!» Era o dia 13 de junho de 1231
Hoje é dia de Santo António! Olhando para este homem, descobrimos nele um grande modelo de fé que soube pautar a sua vida por uma busca constante de Deus na fidelidade ao seu chamamento; um grande evangelizador apaixonado pela verdade e justiça; um homem de coração grande, atento dificuldades das famílias, dos pobres e desfavorecidos.
Filho de ricos comerciantes, Fernando Martins de Bulhões, nasceu em Lisboa, entre 1191 e 1195. Viveu os primeiros anos a dois passos da Sé de Lisboa, onde frequentou a Escola da Catedral. Aos 15 anos entrou no Mosteiro de S. Vicente de Fora, vindo a terminar a sua formação académica no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, onde foi ordenado Sacerdote, após uma formação séria, cuidadosa e empenhada no conhecimento das Sagradas Escrituras e da Tradição da Igreja.
Em Coimbra vai também conhecer uma comunidade de frades franciscanos que viviam no eremitério de Santo Antão dos Olivais. Receberá depois a notícia que cinco deles estão de passagem a caminho de Marrocos, onde – em 16 de Janeiro de 1220 – serão barbaramente martirizados.
Este acontecimento impressionou tanto o jovem Fernando de Bulhões, que decidiu tornar-se discípulo de Francisco de Assis, seguindo o seu ideal de simplicidade e pobreza. Desejava partir para Marrocos como missionário, redimindo assim a vida daqueles jovens mártires. Fez-se franciscano, recebeu o nome de António e partiu em 1220 para aquele território do norte de África. A doença obrigou-o a regressar a Portugal. O navio que o trazia para Lisboa, devido a uma violenta tempestade, foi desviado para a Sicília, onde irá naufragar, e onde será acolhido por irmãos franciscanos de Messina. Estávamos no começo da primavera de 1221.
Agora, na península itálica, peregrina até Assis, onde vai participar no Capítulo Geral e conhecer Francisco de Assis. É convidado, depois, a integrar a comunidade do eremitério de Montepaolo, perto de Forli – no Norte de Itália, todavia, desejando preservar a sua humildade, António nunca divulgou seus conhecimentos.
Em setembro de 1222, os irmãos Dominicanos de Forli convidaram os irmãos Franciscanos para participarem numa cerimónia das Ordenações sacerdotais naquele convento. A determinado momento, o superior dos Dominicanos dirigiu-se aos irmãos Franciscanos, a fim de que um deles usasse da palavra. O Superior do eremitério solicitou, então, ao irmão António que subisse ao púlpito e que dissesse tudo o que lhe fosse sugerido pelo Espírito Santo. A sua sábia intervenção impressionou tanto os presentes, que rapidamente a notícia percorreu toda a região norte da Itália, sendo imediatamente nomeado pregador oficial dos Franciscanos, director de estudos e professor de teologia. Foi Francisco de Assis, que tanto admirou as suas qualidades de sabedoria e sentido missionário, que quis que fosse ele o seu sucessor na orientação da Ordem a que propôs chamar “Frades Menores”.
Foi uma autêntica voz profética no anúncio do Evangelho nos territórios a norte da península itálica e no sul da França, fazendo pontes de comunhão na catolicidade e na verdade.
Enfrentou com firmeza, respeito e mansidão as heresias da época entre os Cátaros e Albigenses, que renovavam as antigas correntes gnósticas e maniqueístas. Com a sua pregação, irá defrontá-los, procurando contrapor-se às suas doutrinas. O conhecimento profundo da Sagrada Escritura deu às suas palavras uma autoridade invulgar, lançando no coração dos ouvintes a solidez do Evangelho. Contra as novas correntes do priscilianismo, defendeu a santidade do matrimónio e a presença real e verdadeira de Cristo no Santíssimo Sacramento.
Testemunhou uma fé comprometida e atuante ao lutar pela aprovação da lei que eliminava a escravidão por dívidas, combatendo também a elevada usura dos banqueiros que exploravam os pobres. A sua pregação era para dar a conhecer a palavra de Deus e ajudar não só a compreendê-la mas a vivê-la, aplicando-a à vida dos seus ouvintes. Este grande homem de Deus, pela forma crítica e assertiva como falava, tornou-se num grande pregador popular, um arauto da Palavra que apelava à conversão de vida, à restauração dos costumes e à vivência da caridade e da justiça evangélicas.
O seu perfil de missionário itinerante, que ia ao encontro das periferias, aponta-nos também a urgência do caminho traçado pelo Papa Francisco para uma Igreja em saída. Fiéis aos sinais dos tempos, somos todos chamados a actualizar a presença de Cristo, Bom Pastor, o enviado do Pai das misericórdias, para salvar e libertar, gerando e fazendo acontecer o Reino de justiça, amor, paz e fraternidade.
Que Santo António fortaleça e ilumine nossa fé, empenhando-nos no anúncio do Evangelho, em comunhão com os anseios do Papa Francisco.
Pe. Alexandre Santos
O Pe. António Vieira pregou, em Roma, três sermões na Igreja de Santo António dos Portugueses. No primeiro desses sermões, encontramos este início, inspirado na passagem bíblica de Mt 5, 14-16: "Vós sois a luz do mundo":
A um português italiano, e a um italiano português, celebra hoje Itália e Portugal. Portugal a Santo António de Lisboa, Itália a Santo António de Pádua. De Lisboa, porque lhe deu o nascimento; de Pádua, porque lhe deu a sepultura… Reparai, diz o evangelista, que António foi luz do mundo. Foi luz do mundo? Não tem logo que se queixar Portugal. Se António não nascera para o Sol, tivera a sepultura onde teve o nascimento; mas como Deus o criou para luz do mundo, nascer numa parte e sepultar-se noutra é obrigação do Sol. Profetizando Malaquias o nascimento de Cristo, diz que nasceria como sol de justiça. E que fez Cristo como sol, e como justo? Como sol mudou os horizontes, como justo deu a cada um o seu. Como sol mudou os horizontes, porque nasceu num lugar e morreu noutro: como justo deu a cada um o seu, porque a Belém honrou com o berço, a Jerusalém com o sepulcro. Assim também Santo António. Se Lisboa foi a aurora do seu oriente, seja Pádua a sepultura do seu ocaso”.
(Pe. António Vieira, Sermões de Roma, ed. Difel, 2009, p. 189-190).