A Quaresma é um tempo especial para aprofundarmos o plano de Deus e revermos a nossa vida cristã. As tentações procuram afastar-nos desse plano. Somos convidados pelo Espírito a viver este tempo de deserto para nos aproximarmos mais de Deus.
A primeira leitura apresenta-nos a tentação dos nossos protoparentes: Adão e Eva. Deus criou-nos para a felicidade e para a vida plena. No entanto o homem preferiu construir o "paraíso" a seu modo, rompendo com o plano de Deus – "sente-se nu" –, sente-se por isso incapaz de ser feliz.
A segunda leitura propõe-nos dois exemplos: Adão e Jesus.
Adão representa o homem que escolhe ignorar as propostas de Deus e decide, por si só, os caminhos da salvação e da vida plena;
Jesus é o homem que escolhe viver na obediência às propostas de Deus.
O esquema de Adão gera egoísmo, sofrimento e morte; o esquema de Jesus propõe vida plena e definitiva.
O Evangelho fala-nos das tentações de Jesus. No deserto, Jesus é tentado a abandonar o plano de Deus e a procurar outros caminhos, mas Ele recusa.
- Tentação da Abundância: Jesus poderia ter escolhido este caminho de realização material, fazendo dos bens materiais a prioridade fundamental da vida. No entanto, Ele sabe que "nem só de pão vive o homem" e que a realização do homem não está no acumular de bens.
- Tentação do Prestígio: Jesus poderia ter escolhido este caminho de êxito fácil, mostrando o seu poder através de gestos espectaculares. Mas Ele responde que não está interessado em satisfazer projectos pessoais do êxito e do triunfo fácil. "Não tentarás o Senhor teu Deus".
- Tentação do Poder e da Riqueza: Jesus poderia ter escolhido um caminho de poder, de domínio. No entanto, Jesus sabe que poder e domínio não são fundamentais na vida. Por isso, responde: "Adorarás o Senhor teu Deus".
As três tentações aqui apresentadas são três faces de uma única tentação: a tentação de prescindir de Deus e de escolher um caminho à margem das propostas de Deus.
Primeira Leitura (Gn 2,7-9;3,1-7)
Leitura do Livro do Génesis
O Senhor Deus formou o homem do pó da terra,
insuflou em suas narinas um sopro de vida, e o homem tornou-se um ser vivo.
Depois, o Senhor Deus plantou um jardim no Éden, a oriente,
e nele colocou o homem que tinha formado.
Fez nascer na terra toda a espécie de árvores,
de frutos agradáveis à vista e bons para comer,
entre as quais a árvore da vida, no meio do jardim,
e a árvore da ciência do bem e do mal.
Ora, a serpente era o mais astucioso de todos os animais do campo
que o Senhor Deus tinha feito.
Ela disse à mulher:
«É verdade que Deus vos disse:
“Não podeis comer o fruto de nenhuma árvore do Jardim”?»
A mulher respondeu:
«Podemos comer o fruto das árvores do jardim;
mas, quanto ao fruto da árvore que está no meio do jardim,
Deus avisou-nos:
“Não podeis comer dele nem tocar-lhe, senão morrereis”».
A serpente replicou à mulher:
«De maneira nenhuma! Não morrereis.
Mas Deus sabe que, no dia em que o comerdes, abrir-se-ão os vossos olhos
e sereis como deuses, ficando a conhecer o bem e o mal».
A mulher viu então que o fruto da árvore era bom para comer
e agradável à vista, e precioso para esclarecer a inteligência.
Colheu o fruto e comeu-o;
depois deu-o ao marido, que estava junto dela, e ele também comeu.
Abriram-se então os seus olhos e compreenderam que estavam despidos.
Por isso, entrelaçaram folhas de figueira
e cingiram os rins com elas.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 50 (51)
Refrão: Pecámos, Senhor: tende compaixão de nós.
Compadecei-Vos de mim, ó Deus, pela vossa bondade,
pela vossa grande misericórdia, apagai os meus pecados.
Lavai-me de toda a iniquidade
e purificai-me de todas as faltas.
Porque eu reconheço os meus pecados
e tenho sempre diante de mim as minhas culpas.
Pequei contra Vós, só contra Vós,
e fiz o mal diante dos vossos olhos.
Criai em mim, ó Deus, um coração puro
e fazei nascer dentro de mim um espírito firme.
Não queirais repelir-me da vossa presença
e não retireis de mim o vosso espírito de santidade.
Dai-me de novo a alegria da vossa salvação
e sustentai-me com espírito generoso.
Abri, Senhor, os meus lábios
e a minha boca cantará o vosso louvor.
Segunda Leitura (Rom 5,12-19)
Leitura do apóstolo S. Paulo aos Romanos
Irmãos:
Assim como por um só homem entrou o pecado no mundo
e pelo pecado a morte,
assim também a morte atingiu todos os homens, porque todos pecaram.
De facto, até à Lei, existia o pecado no mundo.
Mas o pecado não é levado em conta, se não houver lei.
Entretanto, a morte reinou desde Adão até Moisés,
mesmo para aqueles que não tinham pecado
por uma transgressão à semelhança de Adão,
que é figura d’Aquele que havia de vir.
Mas o dom gratuito não é como a falta.
Se pelo pecado de um só pereceram muitos,
com muito mais razão a graça de Deus,
dom contido na graça de um só homem, Jesus Cristo,
se concedeu com abundância a muitos homens.
E esse dom não é como o pecado de um só:
o julgamento que resultou desse único pecado levou à condenação,
ao passo que o dom gratuito, que veio depois de muitas faltas, leva à justificação.
Se a morte reinou pelo pecado de um só homem,
com muito mais razão, aqueles que recebem com abundância
a graça e o dom da justiça, reinarão na vida por meio de um só, Jesus Cristo.
Porque, assim como pelo pecado de um só,
veio para todos os homens a condenação,
assim também, pela obra de justiça de um só,
virá para todos a justificação que dá a vida.
De facto, como pela desobediência de um só homem,
muitos se tornaram pecadores,
assim também, pela obediência de um só, muitos se tornarão justos.
EVANGELHO (Mt 4,1-11)
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
Naquele tempo,
Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto, a fim de ser tentado pelo Demónio.
Jejuou quarenta dias e quarenta noites e, por fim, teve fome.
O tentador aproximou se e disse-lhe:
«Se és Filho de Deus, diz a estas pedras que se transformem em pães».
Jesus respondeu-lhe:
«Está escrito: ‘Nem só de pão vive o homem,
mas de toda a palavra que sai da boca de Deus’».
Então o Demónio conduziu-O à cidade santa,
levou-O ao pináculo do templo e disse-Lhe:
«Se és Filho de Deus, lança-Te daqui abaixo, pois está escrito:
‘Deus mandará aos seus Anjos que te recebam nas suas mãos,
para que não tropeces em alguma pedra’».
Respondeu-lhe Jesus:
«Também está escrito: ‘Não tentarás o Senhor teu Deus’».
De novo o Demónio levou-O consigo a um monte muito alto,
mostrou-Lhe todos os reinos do mundo e a sua glória, e disse-Lhe:
«Tudo isto Te darei, se, prostrado, me adorares».
Respondeu-lhe Jesus:
«Vai-te, Satanás, porque está escrito:
‘Adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele prestarás culto’».
Então o Demónio deixou-O
e logo os Anjos se aproximaram e serviram Jesus.
Ressonâncias
E para nós, seguidores de Jesus, o que é decisivo na nossa vida: as propostas de Deus, ou os nossos projectos pessoais?
– Quando o homem esquece Deus e as suas propostas e se fecha na sua auto-suficiência, facilmente cai na escravidão de outros “deuses” que estão longe de assegurar vida plena e felicidade duradoura. Quais são os deuses que condicionam as nossas decisões e opções?
– Deixar-se conduzir pela tentação dos bens materiais, do “ter mais e mais” é seguir o caminho de Jesus?
– Olhar apenas para o próprio conforto e comodidade, fechar-se à partilha e às necessidades dos outros… será que é seguir o exemplo de Jesus?
– Usar Deus para saciar a nossa vaidade, para promover o nosso êxito pessoal, para dar espectáculo… será que é seguir o exemplo de Jesus?
– Procurar o poder a todo o custo e exercê-lo com prepotência, será que é seguir o exemplo de Jesus?
As Tentações continuam... Qual é a nossa atitude diante delas?